Numa publicação partilhada nas redes sociais alega-se que reutilizar garrafas de água descartáveis “acarreta perigos para a saúde intestinal” e, por isso, esta prática “não é correta”.
De acordo com o autor do post, os riscos “não estão relacionados com os químicos do plástico”, mas sim com a sujidade que se acumula na garrafa.
Segundo a mesma publicação, vão-se acumulando nestas garrafas “micróbios na zona do gargalo e no interior procedentes do ambiente, da boca ou das próprias mãos”.
Depois, com o uso, “aparecem ranhuras, onde as bactérias encontram abrigo”. De acordo com o autor do post, a “maioria dos microrganismos” podem multiplicar-se nestas condições.
Por isso, aconselha-se, se tem uma garrafa de água descartável, “use-a apenas uma vez”. Se tiver antes uma reutilizável, o conselho partilhado é lavá-la todos os dias.
Mas, afinal, a reutilização de garrafas descartáveis é segura ou tem riscos? Em declarações ao Viral, a especialista em segurança alimentar Isabel Ratão e a médica infecciologista Marta Leal dos Santos respondem à questão.
É seguro reutilizar garrafas de água descartáveis?
Questionadas sobre se é seguro reutilizar garrafas de água descartáveis, as duas especialistas consultadas pelo Viral dizem que “depende” da situação, mas alertam que estas garrafas não foram criadas para esse fim.
“As garrafas descartáveis não foram idealizadas para mais utilizações. Se as quisermos usar para outros fins, fazêmo-lo por nossa conta e risco. Não podemos ter a certeza da sua segurança”, afirma Isabel Ratão, especialista em segurança alimentar e professora na área da engenharia alimentar no Instituto Superior de Engenharia da Universidade do Algarve.
Para o transporte de água, a especialista em segurança alimentar “não vê problema” na reutilização deste tipo de recipientes, desde que a garrafa não seja reutilizada “muitas vezes”.
Já para líquidos quentes, esse gesto “nunca é seguro”, realça a especialista. Isto porque, nestas condições, pode haver “migrações do plástico para a bebida” já que as garrafas descartáveis não foram desenvolvidas para suportar calor.
Além disso, aponta, “como as garrafas não são lisas, são muito difíceis de higienizar”.
Por exemplo, se alguém utilizar a garrafa para transportar chá frio e a utilizar apenas uma vez, à partida, “não tem problema, porque não tem de a higienizar depois”. No sentido contrário, se a utilizar mais vezes, já há o risco de “má higiene e problemas futuros”.
Esta é uma ideia também defendida pela médica infecciologista ouvida pelo Viral, que diz “não lhe parecer um perigo” reutilizar uma garrafa de água descartável “uma ou duas vezes”. Contudo, lembra, estas garrafas “não foram concebidas para isso”.
Marta Leal dos Santos acrescenta, contudo, que não é uma boa prática abrir a garrafa, beber alguma água e demorar dias a ingerir toda a água da garrafa, pois este “é o meio ideal para proliferar bactérias que estavam na saliva e vão contaminar a água”.
Na mesma linha, Isabel Ratão dá outro exemplo: “Imagine-se que a pessoa tem uma infecção dentária e bebeu diretamente da garrafa. Está a contaminar a água. Não só é perigoso outra pessoa beber da mesma garrafa, como pode ser perigoso por si própria beber água contaminada passado um ou dois dias”.
Quais os riscos concretos?
A infecciologista Marta Leal dos Santos esclarece que não é a garrafa que é prejudicial para a saúde, mas sim “a qualidade do que está lá dentro”.
Se a água estiver contaminada, pode desencadear uma infecção em alguns casos. Esta água pode até não ter bactérias suficientes para o provocar problemas em pessoas saudáveis. No entanto, em grupos de risco, como idosos, grávidas e doentes com sistema imunitário comprometido, pode ser suficiente para uma infecção, explica a médica.
Já a professora da Universidade do Algarve aponta para o risco de intoxicações alimentares: “Mesmo que não se notem os sintomas pela baixa carga microbiana, podemos estar a ingerir microrganismos que vão contribuir para o desequilíbrio da nossa microbiota natural”.
A especialista refere ainda que as garrafas “nunca devem estar” expostas ao sol, de modo a evitar a “migração de químicos para a água” que se vão acumulando no organismo e podem “causar problemas no futuro”.
E as garrafas reutilizáveis são seguras?
A professora na área da engenharia alimentar no Instituto Superior de Engenharia da Universidade do Algarve considera que as garrafas reutilizáveis são mais seguras, “desde que se cumpram as normas de higiene e segurança”.
Apesar de as reutilizáveis serem “muito mais fáceis de higienizar”, Isabel Ratão lembra que é necessário ter alguns cuidados. Um deles passa por escolher as “mais lisas” para uma limpeza “mais fácil”.
Além disso, a água deve ser renovada “sempre que possível”.
Marta Leal dos Santos também defende que as garrafas reutilizáveis são mais seguras. No entanto, esclarece que importam fatores como o tipo de líquido, o material, o design e os cuidados de cada utilizador.
A segurança varia também consoante o tipo de líquido que a garrafa contém. Por exemplo, uma garrafa com chá adoçado com açúcar pdoe ser mais difícil de higienizar do que uma garrafa com água.
A frequência e o método de lavagem são também fatores a merecer atenção: “Se a lavarmos uma vez por mês e só passarmos por água, vai ser prejudicial para a saúde”.
Por isso, estas garrafas devem ser higienizadas “o mais frequentemente possível”.
Apesar de não haver uma frequência determinada, a garrafa reutilizável deve ser higienizada entre utilizações, recomenda Isabel Ratão.
Além disso, refere Marta Leal dos Santos, se a garrafa for “utilizada por diferentes pessoas e uma delas tiver gripe”, há maior risco de contaminação do que numa garrafa utilizada apenas por uma pessoa.
Por outro lado, o material “mais fácil de higienizar” tem menor risco. De acordo com a infecciologista, as garrafas de vidro e de alumínio “são melhores”, ao contrário das de silicone, em que o material é “mais aderente”.
Isabel Ratão também aponta para o vidro como uma escolha mais benéfica: “As de vidro são mais facilmente higienizáveis e têm a grande vantagem de não sofrer migração, mesmo que sejam sujeitas ao calor”.
A especialista destaca ainda que estas garrafas devem ser substituídas quando começarem a apresentar uma “superfície interna rugosa, ou seja, riscada”, uma vez que isso não permite uma “correta higienização”.
O design é também, para Marta Leal dos Santos, um dos fatores a ter em conta, porque as garrafas com “palhinhas e reentrâncias” não se vão conseguir limpar bem.
Sapo/Viral