Moradores de regiões afetadas pela mineração da Braskem, em Maceió, se dizem insatisfeitos com os valores das indenizações, propostos pela empresa petroquímica.
O que aconteceu
Pelo menos 55 mil pessoas deixaram bairros no entorno das minas de extração de sal-gema devido à instabilidade do solo. A Braskem, apontada como responsável pelo problema — em relatório do Serviço Geológico do Brasil — iniciou o programa de compensação financeira para as famílias. Ele foi assinado, em 2020, com o Ministério Público de Alagoas, o MPF (Ministério Público Federal), a Defensoria Pública estadual e a da União.
A mineradora se comprometeu a pagar o valor equivalente ao do imóvel, danos morais, mudança, auxílio de R$ 5.000 e aluguel de R$ 1.000, por pelo menos seis meses. Alternativa a medidas judiciais, fica a cargo do morador aceitar ou não a proposta. Até novembro de 2023, das 19.096 propostas apresentadas, 18.564 foram aceitas; 343 estão em análise e 127 foram recusadas.
A advogada Andrea Karla Cardoso Amaral recusou a proposta da Braskem. Ela vivia no bairro Pinheiro —uma área de risco— e foi removida de casa com os filhos, por determinação judicial.
Ela diz que sua propriedade tem 250 m² e valor médio de R$ 940 mil. A Braskem ofereceu R$ 685 mil. Sem acordo, o caso foi parar na Justiça. Atualmente Andrea vive com os dois filhos no apartamento de um amigo. Ela conta que empresa ofereceu estadia em hotel, mas que foi obrigada a recusar por não ter espaço para seu cachorro.
A cabelereira Leila Tavares aceitou a proposta da mineradora. “Eu não tinha mais energia emocional para brigar com Braskem”, explica. Antes, viu o comércio no bairro de Bebedouro minguar. Conta que até o fluxo de ônibus caiu. Na época, vivia com a irmã, que necessitava de cuidados especiais. Ela deixou a casa em 2021.
Ela morava no local, há 23 anos — uma herança de seu avô. Depois, comprou um apartamento no bairro Petrópolis, de 46m², mas não se adaptou. Está de mudança para uma casa que precisa de reparo. Hoje, faz parte do Movimento Unificado das Vítimas da Braskem.
Priscilla Barros, do bairro Pinheiro, também aceitou a proposta da mineradora. “Se eu tivesse judicializado, poderia levar 10, 20, 30 anos e não dar em nada”, reflete.
A moradora conta que recebeu apenas 60% do que considerava justo pelo seu imóvel — de cerca de 500m². Comprou uma casa e precisou construir um quarto para avó. Enquanto isso, permanecia na casa em Pinheiro para organizar a mudança, que incluía uma coleção de 30 mil livros.
Com o esvaziamento do bairro, perdeu o comércio próximo. Viu o solo da casa ceder. A edícula no terreno ganhou rachaduras. Em novembro, foi obrigada a deixar a propriedade, que estava em área de risco, por decisão judicial.
“A negociação com a Braskem gera esse mundo de insatisfação”, afirma Cícero Péricles de Carvalho, professor de Economia da UFAL (Universidade Federal de Alagoas). Ele explica que os moradores são pressionados pela situação do afundamento, além do movimento de migração no entorno e o aumento no valor dos imóveis na cidade.
O que dizem os moradores
Com o valor, daria até para comprar um imóvel, mas velho, para você custear toda uma reforma.
“Não vai ser a questão do despejo que vai fazer entregar a casa por qualquer valor. Vou lutar sempre por algo melhor, para eu conseguir comprar uma casa igual a minha”. Andrea Karla Cardoso Amaral, moradora.
“Cuidei da minha irmã por 28 anos. Se eu estivesse só, eu não teria saído, mas eu olhava para ela. A gente tinha acabado de sair da pandemia, que não foi fácil, e vem essa história da Braskem”, disse. “Fiquei com acompanhamento psicológico. Mas não olham a vítima, olham a Braskem. Eles falam ‘Dona Leila, vire a página, vida que segue’.
“Para você ter uma ideia, a avaliação da minha casa [contratada por ela] ficou em R$210 mil, fora os danos morais, que é uma vergonha de R$40 mil. Sabe quanto a Braskem pagou na minha casa? R$123 mil”. Leila Tavares, moradora.
“Acabei aceitando a proposta, que foi injusta, mas aceitei. Comprei uma casa e foi muito difícil achar porque os imóveis aumentaram muito.Priscilla Barros, moradora”.
Alta de preços dos imóveis
Maceió foi a capital, entre as que integram o índice FipeZap, com maior aumento no preço do metro quadrado dos imóveis entre janeiro e novembro deste ano — correspondente a 15,44% A pesquisa acompanha variação de valores em 50 cidades, com base em anúncios na Internet.
O que diz a Braskem
A empresa informou que o Programa de Compensação Financeira e Apoio à Realocação (PCF) utiliza como referência o valor de imóveis semelhantes, com as mesmas dimensões e que estejam situados em bairros de mesmas características.
São também consideradas as benfeitorias relevantes para determinação do padrão construtivo e, assim, somadas ao valor do imóvel. Além disso, a depreciação dos imóveis não é levada em consideração.Braskem, em nota
Sobre os casos citados, a empresa informou que Leila Tavares e Priscilla Barros —acompanhadas de advogados— receberam propostas de indenizações e solicitaram reanálises. Elas aceitaram os valores foram reajustados, os acordos foram assinados e homologados pela Justiça.
Sobre Andrea Amaral, a Braskem disse que o caso foi dado como encerrado, pois a moradora não concordou com o valor do imóvel. O núcleo familiar foi notificado do encerramento, em março de 2023, e foi iniciada a liquidação judicial para que um perito indicado em juízo possa atribuir valor ao imóvel.
Fonte: UOL.