Representantes de trabalhadores e de patrões negociam formas de aplicar o piso salarial da enfermagem em hospitais e clínicas de saúde particulares.
A tentativa de mediação é feita pelo Tribunal Superior do Trabalho (TST), conduzida pelo vice-presidente da Corte, ministro Aloysio Corrêa da Veiga.
Uma reunião está marcada para terça-feira (7). A Confederação Nacional de Saúde (CNSaúde), representando o setor privado, se comprometeu a trazer até lá uma proposta aos trabalhadores.
Um primeiro encontro no TST foi feito em 26 de outubro, de forma separada entre trabalhadores e empresas. A iniciativa de buscar o TST partiu da CNSaúde, depois da definição do Supremo Tribunal Federal (STF) sobre o piso.
O Supremo concluiu o julgamento em julho, e estabeleceu a necessidade de implantação do piso de R$ 4.750 para enfermeiros só depois de negociações coletivas, que deveriam ser feitas em um prazo de 60 dias. Técnicos de enfermagem e auxiliares têm uma porcentagem do valor para seus pisos específicos (R$ 3.325 e R$ 2.375, respectivamente).
Entidades do setor privado dizem que as negociações não foram para frente e que não houve interesse dos trabalhadores em analisar as propostas. Já os representantes da categoria afirmam que os sindicatos patronais perderam o prazo dado pelo STF para os acordos e tentam adiar o pagamento.
Aprovado pelo Congresso e sancionado pelo então presidente Jair Bolsonaro (PL) em agosto de 2022, o pagamento do piso foi suspenso em decisão liminar (provisória) individual do ministro Roberto Barroso. Ele determinou que fossem esclarecidos os impactos econômicos da medida.
A ação no STF havia sido movida pela própria CNSaúde, contestando trechos da lei que aprovou o piso.
A Corte julgou a liberação do piso neste ano. Acabou liberando o pagamento para o setor privado estabelecendo que o piso seria proporcional à carga horária de oito horas diárias e 44 horas semanais de trabalho – se a jornada for menor, o piso será reduzido.
Além disso, determinou que a negociação sindical coletiva é uma “exigência procedimental imprescindível”.
Para o setor público, o STF decidiu que o piso só será pago aos servidores federais e aos funcionários de estados e municípios se a União garantir repasses de verbas.
Patrões
Para Breno Monteiro, presidente da CNSaúde, não houve interesse da parte dos trabalhadores em tocar as negociações na maioria dos estados do país. “Tivemos um ou dois acordos, no máximo, nesse período”, disse à CNN. “Simplesmente foi mandada a proposta e a categoria não aceitou.”
O presidente da entidade classifica a postura como “desrespeito” à decisão judicial. “A decisão mandou negociar, e, quando outro lado não negocia, há um desrespeito à própria decisão.”
O TST foi acionado, segundo Monteiro, porque a Justiça do Trabalho é o ramo que sempre cuidou das negociações trabalhistas. “Tem expertise, prerrogativa, competência”, afirmou. “É o ambiente adequado.”
No tribunal, a busca é por uma mediação que dê algum prazo para que hospitais privados cheguem gradativamente ao valor do piso. Monteiro cita preocupações com as diferenças regionais pelo Brasil para atingir o valor salarial.
A regionalização apareceu em parte dos votos no STF, mas a medida não foi consolidada no resultado do julgamento. Como nenhuma das propostas dos ministros teve maioria, a saída definida por Barroso foi adotar um voto médio entre as três correntes apresentadas.
Para Monteiro, a regionalização precisa ser considerada nas negociações entre patrões e empregados. “Até porque me parece justo, se você trata as regiões que historicamente estão muito mais atrasadas em vários aspectos, e outras que estão mais adiantadas, que essa implantação [do piso] seja nesses estados de forma muito mais célere”, afirmou.
“Nossa expectativa é aquela desde o início, se tivesse fonte de financiamento e como fazer a implementação, ninguém é contra a valorização do profissional da enfermagem”, declarou o presidente da CNSaúde.
“A gente tentou que viesse fonte de financiamento, via desoneração, algum outro projeto, e o governo não atendeu a essa expectativa. Em não atendendo, vamos entender que a gente precisa de um prazo.”
Trabalhadores
Na visão dos representantes dos enfermeiros, o pedido de mediação no TST prejudicou o andamento de convenções coletivas que estavam sendo negociadas pelo país.
Solange Caetano, presidente da Federação Nacional dos Enfermeiros (FNE), disse à CNN que vê a busca da mediação como uma tentativa das empresas de “protelar” o pagamento do piso, mas que os trabalhadores estão dispostos a ouvir a proposta dos patrões.
“Muitos estados que estavam em franca negociação e os [sindicatos] patronais estaduais acabaram recuando porque estão aguardando possível negociação nacional”, afirmou. “Mas, para não dizer que somos intransigentes, vamos ouvir a proposta deles.”
Caetano rejeita o argumento de que os sindicatos de enfermeiros não quiseram negociar. Para ela, houve “erro” da CNSaúde na contagem do prazo de 60 dias para as tratativas.
O período começou a correr a partir da publicação da ata de julgamento, em 12 de julho. A entidade dos hospitais privados, no entanto, entendia que o prazo deveria se iniciar em 1º de agosto, já que julho é mês de recesso no Judiciário.
“O prazo dos 60 dias transcorreu e, quando acabou, aí eles começaram a procurar os sindicatos, e os sindicatos disseram que o prazo tinha acabado. Agora, é óbvio, é a palavra dos trabalhadores contra a palavra dos empregadores”, disse Caetano.
Segundo a presidente da FNE, as negociações que chegaram a ser feitas tiveram pedidos dos sindicatos patronais para parcelar o pagamento do piso ou para vinculá-lo à jornada de 44 horas semanais – quantidade de trabalho maior do que a média da profissão, de 36 horas por semana.
“Tem lugar que quer aumentar a jornada, e também não dá pra aceitar e sequer é indicado [uma jornada de] 44 horas para profissional de enfermagem, é exaustiva, estressante, não cabe para o profissional que cuida de vidas ter essa jornada”, declarou.
Setor público
Para os enfermeiros do setor público não havia ficado dúvida sobre o resultado de julgamento no STF. Nesses casos, ficou decidido que:
- O piso deve ser pago na forma estabelecida em lei para servidores públicos civis da União, autarquias e fundações públicas federais;
- No caso de servidores de estados, Distrito Federal, municípios e de entidades privadas que atendam ao menos 60% de pacientes pelo SUS (Sistema Único de Saúde), o pagamento deve ser feito no limite dos repasses federais. Se faltar dinheiro, a União deve abrir crédito suplementar com recursos de emendas parlamentares.
Nesses casos de insuficiência de recursos, a fonte de dinheiro para a abertura de crédito são recursos inicialmente destinados a ações e serviços públicos de saúde por meio de emendas parlamentares individuais ao Orçamento, ou “direcionadas às demais emendas parlamentares (inclusive de Relator-Geral do Orçamento)”.
Para o setor público, também há o estabelecimento de pagamento proporcional à carga horária.
Segundo o Ministério da Saúde, a despesa anual com a assistência financeira da União aos estados, ao Distrito Federal e aos municípios é estimada em R$ 10,6 bilhões. No entanto, a contar de maio até o fim deste exercício financeiro, são necessários R$ 7,3 bilhões.
Fonte: CNN Brasil.