Usuários reclamam que não há cláusula com a previsão de exclusão nos contratos
Os usuários de planos de saúde individuais com dependentes foram surpreendidos por notificações de uma operadora que propõe a exclusão de beneficiários que atingiram a maioridade, e que não consigam comprovar o vínculo de dependência financeira com o titular do convênio.
A situação tem gerado apreensão entre os segurados, muitos dos quais incluíram seus filhos como dependentes desde o nascimento, e estão há décadas no convênio. Os contratos atingidos são de planos individuais que não possuem, segundo advogados, a cláusula de exclusão.
A notificação da SulAmérica solicita aos clientes o envio da declaração do Imposto de Renda, para a comprovação de dependência legal e financeira entre o titular do plano e o dependente do convênio. O documento endereçado aos clientes cita uma cláusula contratual que, supostamente, requer essa verificação ao atingirem a maioridade.
As regras de dependentes em contratos de planos de saúde variam de acordo com cada operadora e o tipo de plano contratado, mas existem algumas diretrizes gerais comuns à maioria das apólices.
De acordo com a advogada Estela Tolezani, do escritório Vilhena Silva Advogados, especializado em direito à saúde, tanto a Lei 9656/98 — que rege os contratos de planos de saúde –, quanto a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) mencionam quem podem ser considerados dependentes o cônjuge ou companheiro, filho ou enteado.
Além disso, nos contratos mais novos a questão da idade e da exclusão está descrita no acordo celebrado entre o cliente e as operadoras. Normalmente, os planos levam em conta a idade de 21 anos, ou 24 anos se os filhos são estudantes (faculdade ou curso técnico). Para o filho com algum tipo de incapacidade, não há essa limitação de idade.
No entanto, explicam os advogados, há exceções onde esse limite pode se estender por período indeterminado quando o contrato não apresenta cláusulas de exclusão, ou em caso de pessoas com deficiência física, mental que impõe financeira, desde que comprovem essa condição perante a operadora do plano.
Titular de um plano de saúde adquirido em 1998, já com a Lei dos Planos em vigor, a arquiteta Rita Gonçalves, de 65 anos, tem dois filhos, de 23 e 21 anos, que foram automaticamente incluídos no contrato após seu nascimento. Ela paga R$ 4.395,23 mensalmente para ela e os filhos. Rita recebeu a notificação do plano e está apreensiva. A usuária reclama que o contrato original recebeu seus filhos sem cláusula de exclusão.
— Recebi uma carta condicionando a continuidade do atendimento dos meus dois filhos à comprovação de dependência financeira. Não há no contrato uma cláusula de exclusão por dependência financeira. Se fosse o caso de cessão do benefício quando da maioridade deles, eu deveria ter sido notificada quando minha filha mais velha completou 18 anos ou 21 anos, ao menos — afirma ela.
A advogada Estela Tolezani explica que há uma discrepância entre a cláusula de entrada, que exige a comprovação inicial da relação de parentesco e dependência, e a cláusula de cancelamento ou exclusão, que não menciona esse requisito.
— Nos contratos individuais de alguns planos mais antigos não existe cláusula expressa de exclusão. Portanto, o segurado dependente tem direito de permanecer, independentemente da sua idade. Os contratos mais novos já têm essa previsão expressa — explica a advogada.
Ela acrescenta que a validade da notificação ou a possível exclusão dos dependentes pode ir parar na Justiça.
— Não há disposição contratual que preveja a exclusão automática de dependentes ao atingirem a maioridade, nem a obrigação de comprovação anual dessa condição. É possível questionar judicialmente a validade desta notificação, especialmente dado que o contrato estabelece a necessidade de comprovação apenas no momento da entrada do dependente no plano — afirma Estela Tolezani.
Estela Tolezani lembra que essa prática já foi adotada por outras operadoras de planos de saúde, que tentaram excluir dependentes de planos individuais. Alguns consumidores têm buscado na Justiça a permanência dos beneficiários como dependentes nos planos de saúde ou a possibilidade de migrar para um novo plano na modalidade familiar.
IR pode não comprovar dependentes
No caso de Rita, a exigência de comprovação de dependentes através da declaração de Imposto de Renda sequer demonstra a configuração da família:
— Efetivamente, eles dependem de mim, mas como recebiam pensão do pai falecido até outubro deste ano, não costumava incluí-los em minha declaração de renda, para que seus rendimentos — abaixo do patamar tributável — ao serem somados aos meus não ficassem sujeitos à alíquota de tributação de 27% — explica Rita Gonçalves.
Na avaliação de Antônio Gil Franco, sócio de consultoria em gestão de pessoas da Ernest & Young, a declaração de Imposto de Renda não é o melhor instrumento para verificar a dependência, especialmente financeira, e a relação de parentesco com titular de plano de saúde.
— O IR não é um instrumento para determinar se uma pessoa é dependente ou não financeiramente. O Imposto de Renda é uma declaração de dependência para fins ficais. Isso não guarda relação com dependência financeira. Pode ter falhas. Se um filho está na declaração de IR do pai, mas a mãe é a titular do plano de saúde; ou se por uma questão fiscal, o responsável faz uma declaração simplificada para ter direito a uma restituição e não inclui dependentes. Ou ainda se a pessoa coloca alguém como dependente, está na declaração, mas a Receita não aceita e a declaração cai na malha fina, o plano de saúde não vai saber disso — ressalta Antônio Gil.
O consultor da Ernest & Young ressalta ainda que a própria Receita exige, em alguns casos, a certidão de nascimento para comprovar se o dependente tem relação de parentesco ou tutela com o contribuinte que o está declarando.
A SulAmérica foi procurada, mas não comentou o caso.