A Petrobras nomeou no dia 1º de outubro o ex-funcionário Luís Fernando Nery para comandar interinamente a Gerência Executiva de Comunicação e administrar uma verba de cerca de R$ 150 milhões para a contratação de agências de publicidade, comunicação e patrocínios.
Nery, que ocupou o mesmo cargo entre 2015 e 2016, foi demitido em 2019 por envolvimento em suspeitas de corrupção, após uma apuração interna que constatou desvios em verbas de publicidade e eventos.
Em abril passado, o CEO da estatal, Jean Paul Prates, já havia tentado nomeá-lo gerente executivo, mas o comitê de conformidade da empresa vetou a recontratação por causa das irregularidades cometidas no passado.
Prates, então, abrigou Nery como assessor especial da presidência – cargo para o qual não é necessária a aprovação do compliance. Foi lá que o ex-gerente passou os últimos cinco meses, recebendo salário de R$ 63 mil e participando, na prática, de várias decisões importantes da área de publicidade e patrocínio.
Nesse período, a gerência de comunicação foi comandada por uma funcionária de carreira da Petrobras, Vânia Gonçalves. Segundo apurou a equipe do blog, Prates tem dito internamente que Nery é uma indicação pessoal de Lula, o que justificaria sua insistência em nomeá-lo.
Agora, o presidente da Petrobras encontrou uma forma de driblar a exigência do compliance e colocar Nery no cargo.
Pelas regras da empresa, um “substituto eventual” é nomeado quando é preciso “cobrir” uma determinada posição enquanto o executivo titular não vem, e pode ficar no cargo por no máximo 180 dias.
Funcionários da área de comunicação ouvidos pela equipe da coluna, porém, afirmam que na prática Nery já está comandando a área de comunicação desde fevereiro.
A Petrobras, por sua vez, confirmou que Nery assumiu a nova função, mas não explicou por que ele assumiu o cargo no lugar de Vânia Gonçalves e nem respondeu se, como “substituto eventual”, ele será submetido a uma nova avaliação do compliance.
Na companhia ninguém tem dúvidas de que Nery deverá usar a influência da cadeira para tentar se manter no cargo. Os salários da Petrobras não são públicos por se tratar de uma companhia de capital misto, mas a equipe do blog apurou que a remuneração de um gerente executivo varia de R$ 53 mil a R$ 79 mil.
Luis Fernando Maia Nery é ligado a Wilson Santarosa, que também ocupou a gerência de comunicação da Petrobras entre 2003 e 2015, período compreendido pelos governos Lula e Dilma Rousseff.
Mantém ainda conexão estreita com a Frente Única dos Petroleiros (FUP), que, como mostramos no blog, exerce forte influência na cúpula da Petrobras na gestão Prates.
O agora gerente executivo foi alvo de uma comissão interna de apuração (CIA) da estatal após o GLOBO revelar, em 2016, que a companhia gastou mais de R$ 1 milhão em valores da época com ingressos em camarotes no carnaval baiano para políticos e auxiliares da então presidente Dilma Rousseff, além de patrocinar o trio elétrico de um parente do chefe de gabinete do ex-presidente da companhia, José Sérgio Gabrielli.
Ele foi demitido em maio de 2019 em um acordo com a Petrobras, feito antes do final das investigações. Quando a apuração terminou, em maio de 2020, o relatório final concluiu que Nery foi responsável pelas irregularidades e deveria ter sido demitido por justa causa, mas obviamente isso já não era mais possível.
O estatuto da Petrobras diz que não pode ser indicado a cargos de administração na companhia quem possua “falta grave relacionada ao descumprimento do Código de Ética, Guia de Conduta, Manual do Programa Petrobras de Prevenção à Corrupção ou outros normativos internos” ou que tenha sido “enquadrado no sistema de consequência disciplinar”.
Outro episódio que marcou a carreira de Nery foram as denúncias de que ele teria usado o cargo para pressionar a escola de samba carioca Portela a escolher sua mulher, Patrícia Nery, para o posto de rainha de bateria em detrimento da atriz Sheron Menezzes. Na época, a Petrobras patrocinava as escolas de samba do Rio de Janeiro.
Anos antes de sua exoneração, quando estava à frente da Gerência de Responsabilidade Social da empresa, Nery depôs à CPI da Petrobras na Câmara dos Deputados. A comissão parlamentar apurou desvios de verbas da estatal através de ONGs patrocinadas pela companhia.
Jean Paul Prates também indicou outros executivos que se envolveram em escândalos para a cúpula da Petrobras, mesmo sem o aval da área de governança e conformidade.
O exemplo mais simbólico é do diretor jurídico da estatal, Marcelo Mello. Ele foi sócio do ex-diretor e delator da Lava-Jato Nelson Cerveró em uma offshore utilizada para dissimular a compra de um duplex no Rio. O caso levou à condenação de Cerveró a seis anos de prisão por corrupção e lavagem de dinheiro.
Outro executivo, este indicado pelo próprio Marcelo Mello, é o gerente geral Carlos Borromeu de Andrade. Ele atuou na diretoria internacional da Petrobras durante os desvios do Petrolão e era subordinado a Cerveró quando a estatal assinou a compra da refinaria de Pasadena, nos Estados Unidos, por um valor inflacionado – trama também desvendada pela Lava-Jato.
O Globo