Swaps cambiais com a China representam 81% das reservas internacionais argentinas e são destaque nos jornais nesta quinta-feira (23).
O anarcocapitalista Javier Milei, futuro presidente da Argentina, pode ser obrigado a engolir um tremendo sapo, se quiser concretizar seu plano de dolarizar a economia e fechar o Banco Central do país. Já se sabia que a escassez de dólares é um obstáculo, mas outro dado deixa ainda mais claro o tamanho do problema: nada menos que 81% das reservas internacionais da Argentina estão em… yuans, a moeda da “China comunista” abominada por Milei.
É o que mostram estudos de consultorias econômicas argentinas, como a Infobae, e a Ecolatina, fundada pelo ex-ministro da Economia Roberto Lavagna, e relatórios do próprio Banco Central do país. No começo de agosto, a Ecolatina estimava que, quando se excluem as reservas em yuans e os direitos a saque de organismos internacionais, como o Fundo Monetário Internacional (FMI), as reservas do país estavam negativas em US$ 7 bilhões.
Em 03 de novembro, entre o primeiro e o segundo turno da eleição, as reservas internacionais brutas dos hermanos somavam US$ 21,9 bilhões – o equivalente a 3,5% do PIB, segundo a Infobae. Desse total, nada menos que US$ 17,7 bilhões eram representados por contratos de swap de câmbio firmados com o Banco Central da China.
A cifra representa 81% das reservas argentinas. Para piorar o desgosto de Milei, à medida que outras fontes de dólares secam, a importância dos swaps chineses só cresce. Na última semana de 2022, as reservas brutas eram de US$ 44,6 bilhões, dos quais, US$ 18,6 bilhões eram atrelados à moeda chinesa – 41,7% do total.
Em 31 de outubro passado, as reservas já haviam minguado para US$ 26,9 bilhões, mas os swaps chineses recuaram bem menos, para US$ 17,8 bilhões, o que apenas ampliou seu percentual no total para 66,2%.
Plano de dolarização da economia argentina de Javier Milei depende da China; e agora?
A entrada da moeda chinesa nas reservas argentinas data de 2009, quando Cristina Kirchner era presidente e firmou o acordo de swap de moedas entre os bancos centrais de seu país e da China. Desde então, esse acordo foi renovado cinco vezes.
Sua importância estratégica para a estabilidade do câmbio local supera divisões políticas. Firmado por uma presidente peronista, foi renovado em 2017 e ampliado em 2018 por Mauricio Macri, que pode se tornar uma figura central no futuro governo de Milei.
Seu objetivo inicial era permitir que Argentina e China mantivessem relações comerciais, sem recorrer ao dólar. Assim, os contratos de swap determinam a troca de pesos por yuanes e vice-versa, para que os Bancos Centrais liquidem os pagamentos sem a necessidade de converter suas moedas locais em dólares.
Como a China é uma das maiores parceiras comerciais dos argentinos, o acordo fazia sentido. O motivo é que, ao contrário dos chineses, que já se tornaram os maiores exportadores do mundo e podem, portanto, captar quantos dólares quiserem, a Argentina tem uma pauta de exportações bem tímida, baseada em produtos agrícolas vendidos para poucos países – incluindo o Brasil, de quem Milei também quer distância.
Foi durante o governo Macri que os swaps chineses ganharam uma nova função. Em 2017, logo após assumir a presidência, Macri autorizou o Banco Central a converter parte dos yuanes em dólares para quitar compromissos e recompor as reservas internacionais.
A partir daí, esses derivativos de câmbio passaram a ser cada vez mais importantes para estabilizar a moeda e sossegar o mercado. O problema é que a Argentina precisa negociar autorizações especiais da China, sempre que recorre à conversão de yuanes em dólares para quitar outros compromissos, que não sejam o pagamento das importações chinesas.
Passada a euforia inicial com a vitória de domingo (19), a imprensa econômica argentina começa a se preocupar, cada vez mais, com a hostilidade declarada de Milei à China. Afinal, o país presidido por Xi Jinping até pode ser comunista, mas é o dono da chave do cofre argentino – o que pode deixar o anarcocapitalista ainda mais descabelado.
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