A indicação do professor Paulo Picchetti para a diretoria do BC (Banco Central) foi bem recebida pelo mercado, mas não foi suficiente para afastar os temores de uma eventual virada do Copom (Comitê de Política Monetária), responsável pela definição da taxa básica de juros, para um campo menos conservador. Analistas advertem que o economista pode acabar em menor número em um colegiado dominado por ideias mais heterodoxas.
Esse temor foi mantido por causa da indicação do secretário especial adjunto de análise governamental da Casa Civil, Rodrigo Teixeira, para uma das diretorias do BC. Enquanto Picchetti é visto como um quadro técnico pela sua formação e pesquisa na FGV (Fundação Getulio Vargas), onde coordena o IPC-S, Teixeira é considerado mais próximo de ideias heterodoxas e do ministro da Fazenda, Fernando Haddad.
Teixeira é professor da PUC-SP, instituição vista como um dos polos do pensamento heterodoxo em economia no Brasil, e foi chefe de gabinete e secretário-adjunto de Planejamento, Orçamento e Gestão de São Paulo durante a prefeitura de Haddad. A secretária da pasta era a professora da USP Leda Paulani, especializada em economia política e marxismo. Ela foi orientadora do economista no mestrado e no doutorado.
A preocupação de economistas é de que Picchetti pode acabar isolado dentro do Copom, especialmente tendo em vista que o atual diretor de Política Monetária do colegiado, Gabriel Galípolo — indicado por Lula no primeiro semestre e cotado para assumir a Presidência do BC em 2025 —, também é visto com uma tendência mais heterodoxa, sobretudo por artigos escritos com o economista Luiz Gonzaga Belluzzo.
O economista-chefe da G5 Partners, Luís Otávio de Souza Leal, elogia a escolha de Picchetti para o BC, mas chamou a atenção para o perfil de Teixeira. “Talvez, dos quatro nomes que já foram anunciados, ele seja o cara mais de esquerda”, afirma o analista, destacando a produção acadêmica do indicado ao BC durante os anos em que fazia as pós-graduações na USP.
Também professor da PUC-SP, o economista Antonio Correa de Lacerda, membro da comissão de Estudos Estratégicos do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), diz que o colega partiu da matriz marxiana de estudo de economia, mas “não ficou preso a ela” e é “bastante atualizado” no debate teórico e das melhores práticas internacionais. “É um pragmático, nada dogmático e com sólida formação hétero e ortodoxa”, afirma Lacerda, que considerou Teixeira um “excelente nome para a reformulação em curso do BC”.
O economista-chefe da MB Associados, Sergio Vale, ressalta que, à exceção de Picchetti, todos os nomes indicados pelo governo Lula ao BC sinalizam uma composição mais heterodoxa para o Copom. Isso, conforme o analista, levanta dúvidas sobre o perfil dos três próximos indicados — os mandatos do presidente do BC, Roberto Campos Neto, e dos diretores Carolina Assis (Administração) e Otávio Ribeiro Damaso (Regulação) terminam em 31 de dezembro do próximo ano.
“Em duas escolhas, o foco foi essencialmente heterodoxo, e eu acho difícil que não seja novamente na troca de três diretores no ano que vem”, disse Vale. “A pressão que o governo fará em cima do BC reverberará muito mais com uma composição heterodoxa. Há um grande risco de um BC mais acomodado com inflação, como foi no governo Dilma, e será difícil para o banco baixar as expectativas de inflação nesse contexto, especialmente porque o fiscal segue fazendo água.”
Já o economista-chefe do Banco Fator, José Francisco de Lima Gonçalves, elogia a escolha de ambos os novos indicados ao BC e afirma que tanto Picchetti quanto Teixeira afastam os receios de uma virada do Copom ao campo mais heterodoxo.
Mercado mínimo
Um economista do mercado, que pediu para não ter o nome revelado, destaca outro ponto das indicações que vêm sendo feitas pelo governo à diretoria do BC: a tendência de reduzir a quantidade de pessoas egressas do mercado financeiro no Copom. O profissional afirma que esse movimento tem o potencial de reduzir a sensibilidade do BC ao comportamento do mercado, já que seus diretores são oriundos de outras áreas.
“O Copom pode passar a ser um corpo estranho ao mercado”, diz o economista, para quem o mercado tende a ver egressos da área mais positivamente. Ele observa que os profissionais que trabalharam em bancos, gestoras e consultorias que se tornam diretores do BC normalmente são menos propensos a concordar com “experimentos” na condução da política monetária, já que tendem a voltar a postos semelhantes depois.
Se as indicações de Picchetti e Teixeira forem confirmadas, a diretoria do BC passará a ter apenas dois diretores oriundos diretamente do mercado financeiro: o próprio presidente da autarquia, Roberto Campos Neto, que fez carreira na tesouraria do Santander; e o diretor de Política Econômica, Diogo Guillen, que era economista-chefe da Itaú Asset antes de ingressar na autarquia.
Picchetti substituirá Fernanda Guardado, que era economista-chefe do banco Bocom BBM antes de ter sido indicada ao BC. Já Galípolo — que havia sido presidente do Banco Fator, mas ocupava a secretaria-executiva do Ministério da Fazenda quando foi indicado para a autarquia — ocupou o lugar que era de Bruno Serra Fernandes, que antes de se tornar diretor do BC fez carreira no Itaú BBA.
Créditos: R7.