Como você chamaria um ato onde um grupo fortemente armado invade uma festa e mata centenas de jovens? E não apenas isso. O mesmo grupo vai de casa em casa assassinando indiscriminadamente: homens e mulheres, idosos, bebês. Não contente com tanta barbárie, ainda há sequestros e estupros. Você certamente sabe do que estou falando; há dias esse é, infelizmente, assunto recorrente. E possivelmente deve ter visto as tentativas de dar legitimidade aos atos cometidos pelos terroristas – que, aliás, segundo algumas correntes, não devem ser chamados de terroristas, mas de “combatentes”, “insurgentes” e outras amenidades.
Sim, há gente que não considera o assassinato a sangue frio de inocentes motivado por fins políticos como terrorismo. Há pessoas que acham totalmente compreensível degolar bebês e dizimar famílias em nome de uma suposta estratégia de “resistência”. Aqui no Brasil, grupelhos resolveram fazer uma manifestação nas ruas para apoiar a barbárie. O Hamas foi alçado a heroico líder da resistência contra o imperialismo, esse inimigo inventado e festejado pelo esquerdismo. E se é para combater esse suposto inimigo, então tudo vale e é permitido, sem ressalvas. Nas redes sociais, claro, se viu muita postagem absurda, de gente defendendo o horror ou vendo nas ações de barbárie uma “resposta” compreensível diante dos anos de ações abusivas por parte de Israel em relação aos palestinos.
Em outra frente, setores da mídia também tentaram amenizar a gravidade dos atos do Hamas. No Canadá, chamado com razão por Luciano Trigo de o “país mais lacrador do planeta”, um executivo da rede de comunicação estatal, Canadian Broadcast Corporation, recomendou que não se usasse o termo terrorista para se referir ao grupo. O mesmo cuidado foi tomado por outros grandes veículos como o New York Times, Washington Post, e agências de notícias, que usaram outras palavras, como “militantes”, para se referir aos terroristas. Mas como é possível amenizar uma ação dessas? Como achar por um instante que seja que matar, assassinar, estuprar são “respostas” justificáveis? Como não recriminar e nomear adequadamente de terrorista um grupo cuja razão de existir é justamente extinguir outro povo da face da Terra? E mais: qual o interesse em fazer isso?
Limitar o uso das palavras, tentar moldar ou distorcer seus significados, escolher cuidadosamente os termos usados para descrever algo é uma estratégia cada vez mais recorrente, e serve exatamente para, aos poucos, moldar aquilo que pensamos a respeito de alguma coisa. Grupos e partidos políticos que consideram o Hamas como agente legítimo, normalmente pertencem à esquerda que, historicamente, sempre estiveram do lado da luta armada e violenta – a imagem de “partidários do amor” é só pra enganar trouxa. Assim, faz todo o sentido, dentro da lógica distorcida usada por eles, buscar a todo custo não chamar o Hamas de terrorista: eles são apenas “combatentes” que estão “resistindo” a Israel. Claro, evita-se também de todas as maneiras possíveis dar detalhes dessa “resistência”: assassinatos com requintes de crueldade são tratados como se fossem “mortes”, amenizando o horror cometido pelos terroristas. Nesse caso, o interesse em defender o Hamas funciona também como uma estratégia de autopreservação: ao legitimar a ação violenta de outro grupo, abre-se caminho para se justificar a própria violência – os fins justificam os meios, quaisquer meios. Cruel, mas é assim que funciona.
Mas e no caso da imprensa ou de pessoas que não têm qualquer vínculo com grupos políticos ou partidos de esquerda? Qual o sentido em relutar a tratar o Hamas como terrorista ou amenizar seus atos horrendos? Para além das explicações isentonas que argumentam que só após a ONU decretar que o Hamas é terrorista é que se pode chamar o grupo de tal, há muito do velho wokismo: a modinha do pseudo-despertar da consciência para a justiça social, classes oprimidas, feminismo, racismo e muitos outros ismos. Quando aliado à falta de conhecimento, é comum que a ânsia wokista acabe deixando de lado a defesa de quem realmente precisa para se aliar com aquilo que não deveria jamais ser tolerado, que dirá defendido. Passa-se panos em atrocidades apenas por terem sido cometidas por “oprimidos”. Um bandido pobre e negro seria “menos” bandido que um bandido branco e rico, mesmo que ambos cometessem o mesmo crime. Segundo a lógica wokista, no primeiro caso teríamos alguém que foi “levado” ao crime por falta de escolha e oportunidade, e então merece perdão; já no segundo caso, a pessoas tornou-se bandido porque quis e merece ser punido severamente. Tem algum sentido? Não, claro que não, mas o pensamento woke vai por essa linha.
No caso do Hamas, o discurso de defesa do povo palestino – que é, inclusive, oprimido pelo próprio Hamas e outros grupos terroristas – acaba se elevando sobre a condenação necessária aos atos de terror cometidos pelo Hamas. Para o wokismo, apenas o lado do mais fraco – em tese o dos palestinos – deveria ser ouvido, defendido e compreendido. Já o lado de Israel, mais rico e “não oprimido”, não deve nem ser ouvido, pois sempre estará errado. Assim, um ato de violência extrema cometido pelo Hamas é tolerado, quando não justificado, enquanto qualquer ato de Israel, incluindo os de autodefesa são demonizados. Sim, eu sei. Parece conversa de doido – e é mesmo –, mas esse tipo de orientação é muito mais comum do que se imagina e prejudica qualquer debate sério.
Atos de violência com fins políticos jamais podem ser tolerados ou vistos como justificáveis, independentemente de quem os tenha cometido. Não há como achar atenuantes para a violência covarde e infame. E é preciso que nossas palavras consigam expressar nossa indignação contra isso. Hamas é terrorista sim e deve ser chamado assim.
Créditos: Gazeta do Povo.