Sâmio da Silva Santos, de 38 anos, não consegue conter as lágrimas ao relembrar as palavras dos médicos informando, por três vezes, que o seu filho teria morte cerebral. Quando tinha 4 anos, em 2019, o pequeno Samuel foi atropelado enquanto brincava na frente de casa, no Recanto das Emas. O motorista, segundo testemunhas, tinha sinais de embriaguez, chegou a debochar do acidente e fugiu sem prestar socorro. Pelo crime, ele poderia ser preso por até 20 anos, mas a sentença emitida no final do mês passado revoltou a família.
Em regime semiaberto, Ivan Sarafim da Rocha foi condenado a 7 anos e 2 meses de reclusão por tentativa de homicídio com dolo eventual. Como a decisão é de 1ª instância, o motorista vai responder em liberdade porque ficou preso preventivamente por sete meses no início da investigação. Além disso, a sentença não indicou o pagamento de indenização porque seria atribuição de outro juízo.
O acidente
Agora, apaixonado pela velocidade dos seus carrinhos de brinquedo, Samuel assiste televisão em uma cadeira de rodas. O menino acumula uma série de sequelas causadas pelo acidente de trânsito e pelos 44 dias enquanto esteve internado em coma, ficando entre a vida e a morte.
“Uma sensação horrível de chegarem para você e falar que o seu filho vai morrer. Três vezes falaram que ele ia ter morte encefálica porque estava inchando o cérebro. […] Aconteceu alguns casos lá na ala infantil, das crianças falecerem. Eu ficava: “Nossa, será que o próximo vai ser ele?”, relembra Sâmio.
Ele apresenta tetraplegia espástica, sem movimentação ativa em membros inferiores e membro superior esquerdo e complicações neurológicas. A criança também sofreu um traumatismo craniano devido ao atropelamento e teve fraturas nas pernas, além de perfurações em diversos órgãos.
Além das marcas no corpo do Samuel, as consequências do atropelamento mexeram com toda a família. Sâmio precisou deixar o emprego que tinha para se dedicar exclusivamente ao seu filho. Atualmente, ele é a única pessoa que cuida do garoto. Em algumas oportunidades, para comprar as fraldas e alimentos necessários para o desenvolvimento da criança, faz “bicos”, como vender perfumes e montar estruturas em shows.
O menino recebe os cuidados do pai, que vive junto com sua irmã em um pequeno apartamento, na Candangolândia. Quatro anos depois do acidente, Sâmio ainda não conseguiu se estabilizar financeiramente da forma como queria.
O homem procura uma oferta de emprego. Ele tem experiência em áreas da segurança privada, mas está aberto para trabalhar em outras áreas. Pessoas interessadas em auxiliar Sâmio podem entrar em contato através do número: (61) 985563394.
O julgamento
No dia do julgamento, 30 de agosto, Sâmio assistiu toda a decisão: “A vida do cara está seguindo, a do Samuel está ali, foi interrompida. Tudo mudou. Eu tenho um sentimento de impunidade”. Para o pai de Samuel, o que mais doeu nesse processo todo foi a falta de empatia do autor do atropelamento, que chegou a pedir desculpas pelo crime, mas de forma “muito vazia”.
“O que eu iria falar para ele? Ia fazer questão dele olhar para Samuel. […] Olha o que você fez com ele, olha o que tirou dele. Queria ver a expressão dele olhando para o Samuel”, diz o pai. Sâmio ressalta que há também um processo cível sobre o pagamento de um auxílio para o menino, mas eles nunca receberam a ajuda financeira por parte do motorista.
“Não deu amparo nenhum. Esperaria que ele tomasse mais consciência dessa questão já que ele não vai ficar preso. Ele pode trabalhar. Eu não posso porque estou à mercê do Samuel”, conta.
Defesa
O Metrópoles procurou a defesa de Ivan Sarafim da Rocha, que foi representado, neste processo, pela Defensoria Pública do Distrito Federal (DPDF). O homem foi condenado a título de dolo eventual, quando assume o risco de matar, por dirigir embriagado, mas a defesa não concorda com a tese acusatória.
Segundo a defesa, tendo em vista os recentes posicionamentos dos tribunais superiores, a embriaguez que conduz à responsabilização a título doloso refere-se àquela em que a pessoa tem como objetivo se encorajar e praticar o crime ou assumir o risco de produzi-lo. No entanto, para a DPDF, isso não aconteceu nessa situação.
Créditos: Metrópoles.