O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) foi o primeiro presidente a discursar na 78ª Assembleia Geral das Nações Unidas na manhã desta terça-feira (19), em Nova York. Ele criticou o neoliberalismo e disse que esse movimento vem sendo substituído por um movimento aventureiro de “extrema direita”, que classificou como “nacionalismo primitivo, conservador e autoritário”.
Lula não citou o ex-presidente Jair Bolsonaro e defendeu que os ricos paguem impostos proporcionais à sua renda para reduzir a desigualdade na sociedade. Também defendeu Cuba, afirmando que o embargo ao país precisa sumir, e fez críticas veladas aos países que defendem a Ucrânia contra a invasão militar russa.
Lula usou um bordão de campanha dizendo: “a esperança mais uma vez venceu o medo” e alegou ter resgatado a “universalidade” da política externa brasileira.
Sobre o combate às mudanças climáticas, Lula cobrou a promessa das potências mundiais na conferências mundial do clima de Paris em 2015 de darem recursos aos países em desenvolvimento para a realização de ações ambientais.
“A promessa de dar US$ 100 bilhões por ano permanece apenas isso, uma longa promessa”, disse.
Ele começou sua fala falando sobre a necessidade de se combater a mudança climática, a fome e a desigualdade no planeta. Ele estava diante de representantes dos outros 193 países-membros da ONU. A Assembleia Geral acontece anualmente e tem o objetivo de discutir assuntos de relevância para a humanidade.
A cúpula deste ano ocorre em um cenário singular, no qual os Estados Unidos e seus aliados do Ocidente competem com a China e com a Rússia pelo apoio do chamado Sul Global, formado por países em desenvolvimento na África, Ásia e América Latina.
Isso ocorre devido à polarização mundial intensificada pela invasão russa na Ucrânia. As potências do Ocidente deverão usar a Assembleia da ONU para ouvir as demandas dos países em desenvolvimento para tomar ações para conter o aumento da influência chinesa e russa nos países do Sul Global.
Além do brasileiro, outros 15 chefes de estado também discursam no evento durante a manhã desta terça, entre eles o presidente dos Estados Unidos, Joe Biden.
O secretário-geral da ONU, Antônio Guterres, abriu o evento e fez uma defesa da Ucrânia, deixando claro que esse será um dos principais temas da cúpula. Ele era assistido pelo presidente da Ucrânia, Volodymyr Zelensky, está presente na cúpula.
Lula critica países que fornecem armas para a defesa da Ucrânia contra a Rússia
Sem citar a Rússia, Lula disse que a guerra na Ucrânia “escancara nossa incapacidade coletiva de fazer prevalecer os propósitos e princípios da Carta da ONU”. O petista também disse que não se deve subestimar as dificuldades para alcaçar a paz e defendeu que “nenhuma solução será duradoura se não for baseada no diálogo”.
“Não haverá sustentabilidade nem prosperidade sem paz. Os conflitos armados são uma afronta à racionalidade humana. Conhecemos os horrores e os sofrimentos produzidos por todas as guerras.A promoção de uma cultura de paz é um dever de todos nós”, disse.
O petista também fez uma crítica velada aos países do Ocidente que têm fornecido armamento à Ucrânia para se defender dos ataques russos. “Tenho reiterado que é preciso trabalhar para criar espaço para negociações. Investe-se muito em armamentos e pouco em desenvolvimento”, disse.
Lula diz que Conselho de Segurança da ONU está perdendo credibilidade
Após um aceno do secretário-geral da ONU, António Guterres, sobre a necessidade por reformas nos organismos mundiais, o discurso de Lula criticou o Conselho de Segurança da ONU e seus membros permanentes.
“O Conselho de Segurança da ONU vem perdendo progressivamente sua credibilidade. Essa fragilidade decorre em particular da ação de seus membros permanentes, que travam guerras não autorizadas em busca de expansão territorial ou de mudança de regime”, disse.
O petista já repetiu esse discurso em outras ocasiões e enfatizou a necessidade de incluir novos países à lista de membros permanentes do Conselho. Atualmente apenas Estados Unidos, França, Reino Unido, Rússia e China têm poder de veto na organização.
Lula tem defendido a inclusão do Brasil, da Índia e da África do Sul ao seleto grupo. “Sua paralisia é a prova mais eloquente da necessidade e urgência de reformá-lo, conferindo-lhe maior representatividade e eficácia”, disse em seu discurso.
Lula e Guterres e Bideb convergem em discurso sobre governança global
O tema da reforma do Conselho de Segurança da ONU também foi abordado por Guterres que defendeu necessidade de reformas em instituições globais. Ele afirmou com muita ênfase que a governança global ficou parada no tempo. “O mundo mudou e nossas instituições não”, afirmou. Segundo ele, órgãos como a ONU correm o risco de em vez de resolver problemas se tornem a fonte dos problemas.
O presidente americano, Joe Biden, disse em seu discurso após a fala de Lula que o Conselho de Segurança da ONU “precisa de mais vozes”. Ele afirmou querer fazer progressos na discussão de uma reforma no próximo ano.
Dívidas de países pobres e desigualdade marcam discursos do Ocidente
Guterres, também abordou o problema da dívida externa de países em desenvolvimento. Afirmou que países da África gastam mais com o pagamento de dívidas do que com investimento em saúde pública.
Biden, por sua vez, defendeu que essas desigualdades devem ser combatidas por meio do fortalecimento de bancos internacionais de desenvolvimento, como o Banco Mundial. Ele também disse que é preciso fazer reformas no Fundo Monetário Internacional e na Organização Mundial do Comércio. Também celebrou a inclusão da União Africana no G20, o bloco de países que reúne potências industriais e países em desenvolvimento em um único fórum de discussão.
O pontos abordados pelo secretário-geral da ONU e pelo presidente americano fazem parte do esforço do Ocidente para se aproximar dos países em desenvolvimento, que estão sendo assediados pela China e pela Rússia. Eles também convergem com parte da agenda, que abordou em seu discurso a necessidade de se combater a mudança climática, a fome e a desigualdade no planeta. O presidente brasileiro vem usando essa agenda para tentar se vender internacionalmente como um porta-voz dos países em desenvolvimento.
Porém, declarações polêmicas de Lula neste ano de apoio à Rússia contra a Ucrânia e de caráter antiamericano têm colocado o brasileiro em uma posição de coadjuvante para assumir tal papel. O papel de líder do Sul Global vem sendo disputado interncionalmente pelo líder chinês Xi Jinping e pelo presidente indiano, Narendra Modi, que não estão presentes no evento.
Gazeta do Povo