A analista de gerenciamento de risco Thayane Angelo, de 32 anos, desenvolveu um transtorno de ansiedade em 2019, enquanto aguardava um “coração novo”. Foram 8 meses na fila do transplante, com a malinha do hospital pronta, sem deixar o celular descarregar por um minuto sequer (veja mais no vídeo acima).
“É uma espera muito dolorosa, podem te ligar a qualquer momento. Eu ia piorando a cada dia”, diz.
Nesta reportagem, entenda as etapas enfrentadas por Thayane antes e depois da ligação que ela recebeu em 3 de dezembro daquele ano, quando ouviu de sua médica: “temos um possível coração aqui para você”.
A paciente conversou com o g1 em 21 de agosto de 2023, quase quatro anos após o transplante e um dia depois de assistir ao jogo do Vasco no Maracanã. “Pude voltar a acompanhar as emoções de uma partida e gritar ‘gol’ em paz, sem passar mal”, conta, rindo.
🫀Por que o transplante de Thayane foi necessário? Ela nasceu com miocardiopatia hipertrófica e dilatada — uma doença caracterizada pela dilatação e enrijecimento dos músculos cardíacos, tornando-os incapazes de bombear sangue em quantidade suficiente para o organismo. Resultado: Thayane se sentia cansada até para tarefas simples, como caminhar ou fincar os pés na areia quando ia à praia.
“Em 2019, fiquei muito mal, não conseguia mais comer, tomar banho sozinha nem lavar meu cabelo. No calor, eu desmaiava. Foi aí que, em fevereiro, entrei para a fila do transplante.”
⌚Como foi a espera na fila? “Foi um baque”, conta Thayane. “Desenvolvi ansiedade, porque você não pode ficar com o telefone fora de área. Não viajei, porque fiquei com medo de me ligarem e eu não conseguir voltar a tempo para a minha cidade.”
A fila para um transplante de coração leva em conta a gravidade do quadro do paciente. Quem necessita de internação constante (com uso de medicamentos intravenosos e de máquinas de suporte para a circulação do sangue) tem prioridade em relação à pessoa que aguarda o órgão em casa, por exemplo. No Brasil, até a última atualização desta reportagem, eram 386 pacientes à espera de um coração.
“O médico me deu um login para eu acompanhar minha posição na espera. Cheguei a ficar em 1º lugar, empatada com outra pessoa, mas o coração que apareceu não era compatível com alguém do meu peso”, diz. “Dois meses depois, minha vez chegou.”
📱O que fazer ao receber a notícia da chegada do órgão? Assim que Thayane atendeu a ligação da médica, tomou banho, pegou a bolsa com seus pertences (que estava arrumada há meses) e correu para o hospital. A rapidez — tanto do transporte do órgão quanto do paciente — é essencial para o sucesso do transplante, explica Samuel Padovani Steffen, cirurgião cardiovascular da Rede D’Or.
“Há um prazo de 4 horas entre tirar o coração do doador e terminar a cirurgia de implante no receptor”, explica. “Se o órgão demorar 1 hora para chegar ao hospital, o médico terá 3 horas para fazer o coração voltar a bater na outra pessoa.”
Thayane conta que nem pensava na cirurgia em si. “Foquei em imaginar que voltaria a andar de bicicleta, a correr, a ir para a praia. Minha psicóloga falou comigo no caminho para o hospital e nem acreditou na minha calma.”
🏥Quanto tempo a paciente ficou internada? Em geral, os transplantados ficam, em média, 30 dias no hospital, explica o cirurgião Steffen. É importante garantir que não haverá uma rejeição do organismo ao novo órgão.
No caso de Thayane, foram 28 dias de internação. “Quando fui para casa, já pude caminhar na rua. Em dois meses, comecei a reabilitação cardíaca, que é igual a uma academia, só que com um médico ao lado”, afirma.
🏃♀️Há alguma limitação? “Do ponto de vista cardiovascular, a pessoa pode retomar sua rotina”, explica o médico. “É só proteger o coração. A medicina evolui a cada dia. Nós dizemos: ‘[o órgão] vai durar para sempre, toque sua vida.”
Thayane segue os cuidados à risca.
“Eu sei que transplante é um tratamento, então, faço a manutenção certinha: musculação, corrida na esteira, alimentação saudável… É uma vida 98% ‘normal’. Se eu tiver uma gripe, vou ficar mais ‘derrubada’ que vocês. Quando vou ao estádio, uso máscara. Mas consigo ver meu time no Maracanã”, diz.
Desde a cirurgia, Thayane conversa com outros pacientes que estão na fila do transplante. “Tento dar um gás neles. Quando conto minha história, eles se animam! E deixo sempre a mensagem da importância de doar órgãos. Conversem com a família de vocês.”
Créditos: G1.