Morreu nesta terça-feira, aos 90 anos, a atriz Lea Garcia. Ela estava no Festival de Gramado, onde seria homenageada pelo conjunto da obra com o troféu Oscarito. A informação foi confirmada pelos familiares de Léa, nas redes sociais.
“É com pesar que nós familiares informamos o falecimento agora na cidade de Gramado no @festivaldecinemadegramado da nossa amada Léa Garcia”.
Léa estava circulando pelo Festival, que começou no último sábado, todos os dias. Chegou a posar sorridente na frente do troféu Kikito.
Léa Garcia em Gramado — Foto: Cleiton Thiele/Agência Pressphoto.
A carioca Léa Lucas Garcia de Aguiar estreou nos palcos aos 19 anos de idade, na peça “Rapsódia Negra”, de Abdias do Nascimento. Foi o interlectual e criador do Teatro Experimental do Negro (TEN), inclusive, que viu seu talento, quando a conheceu no ponto do bonde, em 1950, na praia de Botafogo.
“Estava indo buscar minha avó para levá-la ao cinema quando uma pessoa veio ao meu encontro e perguntou: ‘Você não gostaria de fazer teatro?’”, contou Léa à revista ELA, do GLOBO.
Léa, então, se apaixonou – não só por Abdias, com quem teve teve dois filhos (Henrique Christovão Garcia do Nascimento e Abdias do Nascimento Filho), mas pelas artes. A partir de então, seguiu carreira nas artes cênicas e, em 1956, esteve no elenco da peça “Orfeu da Conceição”, de Vinícius de Moraes. Ela também participou do filme, dirigido pelo francês Marcel Camus um ano depois. Sua atuação rendeu-lhe uma indicação ao prêmio de Melhor Atriz no Festival de Cannes.
Na TV, a primeira novela de Léa foi “Acorrentados”, de 1969, na Record. Antes disso, participou de programas como “Grande Teatro”, da TV Tupi, e “Vendem-se Terrenos no Céu”. Sua estreia na TV Globo aconteceu em 1970, em “Assim na Terra como no Céu”, obra de Dias Gomes.
Léa esteve no elenco de sucessos da TV Globo como “Selva de pedra”, de Janete Clair, exibida em 1972, e “Escrava Isaura”, adaptação de Gilberto Braga para a obra de Bernardo Guimarães, no ar em 1976. Nesta novela, fez sua primeira vilã e sofreu represálias na rua.
“Escrava Isaura é o meu cartão de visitas. Tive muitas dificuldades em fazer cenas de maldade com a Lucélia Santos. Eu me lembro de uma cena em que, quando a Rosa (personagem de Léa) acabou de fazer todas as perversidades com a Isaura, eu tive uma crise se choro, me pegou muito forte. Chorei muito, não com pena, mas porque me tocou”, disse Léa ao site “Memória Globo”.
Na Manchete, fez parte de “Dona Beija”, em 1986, escrita por Wilson Aguiar Filho, “Tocaia grande”, de Duca Rachid baseado na obra de Jorge Amado, exibida em 1995, e “Xica da Silva”, de 1996, escrita por Walcyr Carrasco.
Nos anos 2000, participou ainda de “O Clone”, em 2002, novela de Glória Perez na TV Globo; “A Lei e o Crime”, em 2009, de Marcílio Moraes para a Record; a série do Globoplay “Assédio”, em 2018, escrita por Maria Camargo, entre outras participações. No dia 25 de agosto, entra no ar no Canal Brasil “Vizinhos”, um de seus últimos trabalhos.
Léa estava cotada também para participar do remake da novela “Renascer”, de Bruno Luperi, baseada na obra de Benedito Ruy Barbosa, que estreia depois de “Terra e paixão”, no horário das 21h da TV Globo.
Reconhecimento
Foram mais de 30 participações no cinema, entre curtas e longas-metragens, que renderam a Léa prêmios nacionais e internacionais. Além da indicação como melhor atriz do Festival de Cannes com “Orfeu negro”, seu primeiro filme, a carioca foi eleita melhor atriz, inclusive pelo júri popular, do Festival de Gramado por “Filhas do vento” (2005), de Joel Zito Araújo. Gramado a premiou novamente em 2013 como melhor atriz de curta-metragem por “Acalanto” (2012), Arturo Saboia, baseado num conto de Mia Couto. Este mesmo curta lhe rendeu o prêmio de melhor atriz no Brazilian Film Festival of Toronto, no Canadá.
Seu último filme foi “Barba, Cabelo & Bigode” (2022), da Netflix, dirigido por Rodrigo França.
No ano passado, para comemorar 70 anos de carreira, voltou aos palcos, onde tudo começou, e estrelou o espetáculo “A vida não é justa”, dirigido por Tonico Pereira, e baseado no livro homônimo em que Andréa Pachá relata episódios de sua experiência como juíza de uma Vara de Família.
— Ultimamente, tinha virado atriz de dois personagens só. Me chamavam para fazer mãe preta ou mãe de santo. Está sendo agradável sair desse olhar estereotipado, que coloca a mulher negra idosa num determinado tipo de representação. Essas, agora, são simplesmente mulheres — disse a atriz a O GLOBO em julho de 2022.
Extra/Globo