Ao julgar o piso da enfermagem, Barroso e Mendes entenderam que esse tipo de lei pode ferir a autonomia dos entes federativos
O resultado do julgamento sobre o piso da enfermagem, aprovado pelo Congresso no ano passado, foi apresentado pelo Supremo Tribunal Federal (STF) na noite da última segunda-feira (3/7). A decisão representa uma vitória para os profissionais de enfermagem, mas é um balde de água fria para as demais categorias que esperavam a criação de um piso salarial nacional.
Apesar de haver contestações sobre a proclamação do resultado por Luís Roberto Barroso, houve uma larga maioria de 8 votos no sentido de dizer que futuras iniciativas nessa direção “passarão a ser vistas como potencialmente incompatíveis com a Constituição”.
Os ministros afirmam que o STF sempre respeitou o poder e a liberdade do Congresso para fixar pisos salariais nacionais, mas que a possível generalização dessa prática “coloca em risco o princípio federativo e a livre-iniciativa”.
Os ministros ainda afirmam que a Constituição Federal não fala em piso nacional, e sim em piso salarial – o salário mínimo é o único que tem valor nacional unificado. “Já o piso salarial, previsto no art. 7º, V, do texto constitucional, é devido a determinada categoria econômica ou profissional e leva em consideração a extensão e a complexidade dos serviços prestados. Não há referência a ser nacional”, escrevem Barroso e Gilmar Mendes.
Para o professor Flávio de Leão Bastos Pereira, da Universidade Presbiteriana Mackenzie, não se pode afirmar que todas as leis que tratam de pisos nacionais serão consideradas inconstitucionais pelo Supremo a partir de agora. “Mas há uma sinalização de que pisos nacionais impostos por lei federal que limitem a autonomia de estados, municípios e o Distrito Federal poderão ser considerados inconstitucionais”, diz o professor.
Pisos nacionais
Há 156 projetos em tramitação na Câmara e no Senado para a criação de pisos salariais. O rol de profissionais que seriam beneficiados se os textos forem aprovados é extenso e inclui policiais, bombeiros, cirurgiões-dentistas, técnicos agrícolas, instrutores de artes marciais, radialistas, operadores de telemarketing, costureiras, professores, vigilantes, fonoaudiólogos, garçons, biomédicos, entre outros.
Só na área da saúde, há textos avançados para estabelecer um mínimo salarial para nutricionistas, técnicos em radiologia, biólogos, farmacêuticos e agentes de vigilância sanitária. Segundo estimativa da Confederação Nacional dos Municípios (CNM), o impacto da aprovação de 21 desses projetos da área de saúde pode chegar a R$ 29 bilhões aos cofres municipais.
A Constituição prevê que os trabalhadores têm direito a pisos salariais proporcionais à extensão e à complexidade de seus trabalhos. Para as categorias, a aprovação de um piso nacional no Congresso é uma forma de garantir um valor mínimo para os profissionais sem ficar vinculado exclusivamente de negociações.
A depender do contexto, há interesse político na aprovação desses textos. No caso do piso da enfermagem, o projeto de lei foi criado quando esses profissionais estavam na linha de frente do combate à pandemia. “Nosso mandato pensou nesse projeto como uma reparação justa e histórica, como reconhecimento de uma categoria que vem almejando por dignidade há décadas”, disse o senador Fabiano Contarato (PT-ES), autor do projeto.
Críticos, no entanto, pontuam que a criação de pisos nacionais desconsidera as diferentes realidades econômicas dos estados brasileiros e pode provocar efeitos adversos tanto para os profissionais como para a população, com demissões e precarização dos serviços.
“Para o profissional que ganha menos que o piso a aprovação é uma notícia ótima. Agora, o que vem junto com isso não é muito bom. A economia vai se ajustar, pode haver demissões, substituição de profissionais mais caros por mais baratos, e repasse de custos aos consumidores”, diz o professor de economia Hélio Zylberstajn, da USP.
Na avaliação dele, o melhor caminho é a negociação coletiva, por isso defende que o Congresso deixe de lado projetos que falam de pisos nacionais e passe a discutir uma estrutura de representação sindical mais eficiente e representativa.
No caso do piso da enfermagem, o STF optou por uma saída intermediária. A Corte estabeleceu que o piso determinado pelo Congresso deverá ser pago aos servidores da União, dos estados, dos municípios e de entidades que atendam 60% de pacientes do Sistema Único de Saúde – no caso destes três últimos, o pagamento está condicionado a repasses da União.
Já para os profissionais da iniciativa privada, o pagamento deverá ser negociado coletivamente entre patrões e funcionários. Se não houver acordo após 60 dias, o valor determinado pela lei prevalecerá. Associações representantes da saúde privada devem recorrer do resultado do julgamento assim que a ata for publicada. As entidades se queixam da obrigação em aplicar a lei, caso não haja acordo.
O piso nacional da enfermagem foi estabelecido em R$ 4.750 para os profissionais de enfermagem; R$ 3.325 para os técnicos de enfermagem e R$ 2.375 para auxiliares e parteiras.
Ao julgar o piso da enfermagem, Barroso e Mendes entenderam que esse tipo de lei pode ferir a autonomia dos entes federativos
O resultado do julgamento sobre o piso da enfermagem, aprovado pelo Congresso no ano passado, foi apresentado pelo Supremo Tribunal Federal (STF) na noite da última segunda-feira (3/7). A decisão representa uma vitória para os profissionais de enfermagem, mas é um balde de água fria para as demais categorias que esperavam a criação de um piso salarial nacional.
Apesar de haver contestações sobre a proclamação do resultado por Luís Roberto Barroso, houve uma larga maioria de 8 votos no sentido de dizer que futuras iniciativas nessa direção “passarão a ser vistas como potencialmente incompatíveis com a Constituição”.
Os ministros afirmam que o STF sempre respeitou o poder e a liberdade do Congresso para fixar pisos salariais nacionais, mas que a possível generalização dessa prática “coloca em risco o princípio federativo e a livre-iniciativa”.
Os ministros ainda afirmam que a Constituição Federal não fala em piso nacional, e sim em piso salarial – o salário mínimo é o único que tem valor nacional unificado. “Já o piso salarial, previsto no art. 7º, V, do texto constitucional, é devido a determinada categoria econômica ou profissional e leva em consideração a extensão e a complexidade dos serviços prestados. Não há referência a ser nacional”, escrevem Barroso e Gilmar Mendes.
Para o professor Flávio de Leão Bastos Pereira, da Universidade Presbiteriana Mackenzie, não se pode afirmar que todas as leis que tratam de pisos nacionais serão consideradas inconstitucionais pelo Supremo a partir de agora. “Mas há uma sinalização de que pisos nacionais impostos por lei federal que limitem a autonomia de estados, municípios e o Distrito Federal poderão ser considerados inconstitucionais”, diz o professor.
Pisos nacionais
Há 156 projetos em tramitação na Câmara e no Senado para a criação de pisos salariais. O rol de profissionais que seriam beneficiados se os textos forem aprovados é extenso e inclui policiais, bombeiros, cirurgiões-dentistas, técnicos agrícolas, instrutores de artes marciais, radialistas, operadores de telemarketing, costureiras, professores, vigilantes, fonoaudiólogos, garçons, biomédicos, entre outros.
Só na área da saúde, há textos avançados para estabelecer um mínimo salarial para nutricionistas, técnicos em radiologia, biólogos, farmacêuticos e agentes de vigilância sanitária. Segundo estimativa da Confederação Nacional dos Municípios (CNM), o impacto da aprovação de 21 desses projetos da área de saúde pode chegar a R$ 29 bilhões aos cofres municipais.
A Constituição prevê que os trabalhadores têm direito a pisos salariais proporcionais à extensão e à complexidade de seus trabalhos. Para as categorias, a aprovação de um piso nacional no Congresso é uma forma de garantir um valor mínimo para os profissionais sem ficar vinculado exclusivamente de negociações.
A depender do contexto, há interesse político na aprovação desses textos. No caso do piso da enfermagem, o projeto de lei foi criado quando esses profissionais estavam na linha de frente do combate à pandemia. “Nosso mandato pensou nesse projeto como uma reparação justa e histórica, como reconhecimento de uma categoria que vem almejando por dignidade há décadas”, disse o senador Fabiano Contarato (PT-ES), autor do projeto.
Críticos, no entanto, pontuam que a criação de pisos nacionais desconsidera as diferentes realidades econômicas dos estados brasileiros e pode provocar efeitos adversos tanto para os profissionais como para a população, com demissões e precarização dos serviços.
“Para o profissional que ganha menos que o piso a aprovação é uma notícia ótima. Agora, o que vem junto com isso não é muito bom. A economia vai se ajustar, pode haver demissões, substituição de profissionais mais caros por mais baratos, e repasse de custos aos consumidores”, diz o professor de economia Hélio Zylberstajn, da USP.
Na avaliação dele, o melhor caminho é a negociação coletiva, por isso defende que o Congresso deixe de lado projetos que falam de pisos nacionais e passe a discutir uma estrutura de representação sindical mais eficiente e representativa.
No caso do piso da enfermagem, o STF optou por uma saída intermediária. A Corte estabeleceu que o piso determinado pelo Congresso deverá ser pago aos servidores da União, dos estados, dos municípios e de entidades que atendam 60% de pacientes do Sistema Único de Saúde – no caso destes três últimos, o pagamento está condicionado a repasses da União.
Já para os profissionais da iniciativa privada, o pagamento deverá ser negociado coletivamente entre patrões e funcionários. Se não houver acordo após 60 dias, o valor determinado pela lei prevalecerá. Associações representantes da saúde privada devem recorrer do resultado do julgamento assim que a ata for publicada. As entidades se queixam da obrigação em aplicar a lei, caso não haja acordo.
O piso nacional da enfermagem foi estabelecido em R$ 4.750 para os profissionais de enfermagem; R$ 3.325 para os técnicos de enfermagem e R$ 2.375 para auxiliares e parteiras.