Após concluir a votação da reforma tributária, a Câmara dos Deputados aprovou nesta sexta-feira (7) um projeto que favorece o governo no caso de empates em julgamentos no Conselho de Administração de Recursos Fiscais (Carf). Agora, o texto vai ao Senado.
O Carf julga disputas entre contribuintes e o Fisco. O projeto retoma o chamado “voto de qualidade” nos julgamentos do órgão, vinculado ao Ministério da Fazenda.
O mecanismo estabelece que, em casos de empate, o presidente do colegiado deve desempatar. Como o cargo é reservado a um representante da Fazenda Nacional, em tese, será beneficiado o Fisco.
O fim do chamado voto de qualidade foi aprovado em 2020 na MP do Contribuinte Legal, e passou a favorecer o contribuinte em caso de empate.
As mudanças nas regras são uma parte central do pacote da área econômica para conseguir contornar a previsão de déficit público neste ano, de R$ 231,5 bilhões.
Pelas contas da equipe econômica, o governo federal poderia arrecadar até R$ 50 bilhões com as alterações originalmente propostas no projeto — uma arrecadação tida como primordial em meio à nova regra fiscal, que atrela o aumento de despesas ao aumento de arrecadação.
Como o relator Beto Pereira (PSDB-MS) fez mudanças no texto que foi enviado pelo governo, que podem favorecer os contribuintes, a projeção de arrecadação deve ser alterada.
Pereira manteve o atual limite de alçada em 60 salários mínimos (79,2 mil), diferentemente do que o governo havia proposto no texto inicial, que previa 1.000 salários mínimos (1,32 milhão).
Limite de alçada é o valor mínimo da disputa que define a competência do Carf para julgar um processo administrativo — ou seja, é o valor a partir do qual o contribuinte pode recorrer ao conselho.
“Houve um apelo do setor produtivo, frentes parlamentares e diversas confederações, um questionamento muito grande sobre cercear um direito do contribuinte com limite de alçada de mil salários mínimos. O degrau era muito grande”, afirmou o relator.
“Isso poderia de alguma forma inviabilizar o acesso de demanda, de poder buscar uma decisão na última instância administrativa por uma limitação de alçada. Então, nós decidimos manter o limite de 60 salários mínimos para alçada ao Carf”, completou.
O relator incluiu no texto um acordo firmado entre o governo e a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB).
Segundo o que ficou acordado, quando uma empresa ou pessoa física perder uma causa no Carf devido ao voto de qualidade, a multa e os juros serão cancelados, desde que o contribuinte manifeste a intenção de pagar o valor principal em até 90 dias.
O pagamento do débito poderá ser feito em 12 parcelas mensais e sucessivas. No caso de não pagamento ou de inadimplemento de qualquer das parcelas previstas, serão retomados os juros de mora.
Para o pagamento, o texto permite o uso de créditos de prejuízo fiscal, de base de cálculo negativa de CSLL e também precatórios.
Caso não concorde com a dispensa da multa e dos juros, o contribuinte pode recorrer à Justiça sem precisar apresentar uma garantia, como é feito hoje.
Na última versão, o relator incluiu a exigência de que a medida não será concedida aos contribuintes que, nos últimos 12 meses antes da ação, não tiveram a certidão de regularidade fiscal válida por mais de três meses, emitida pela Receita Federal e pela Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional.
O texto assegura ainda a sustentação oral de contribuintes nas Delegacias da Receita Federal de Julgamento (DRJs), a primeira instância do processo administrativo fiscal. Atualmente, isso não é possível.
Outro ponto é a vinculação das DRJs às súmulas de jurisprudência do Carf.
Depois de pressões da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) e da Advocacia Geral da União (AGU), o relator tirou um dos pontos previstos no seu parecer que permitiria a atuação da Receita Federal em transações tributárias, ou seja, resoluções dos processos tributários em julgamento.
O projeto determina que, se contribuinte não aceitar as condições de pagamento, haverá inscrição dos crédito em dívida ativa no prazo de 90 dias – o prazo atual é de 30.
Contudo, o relator abria brechas para que a legislação incluísse, também, a cobrança dos débitos administrados pela Receita Federal ainda não inscritos em dívida ativa.
Nos últimos dias, esse ponto foi alvo de debate entre procuradores da Fazenda Nacional e auditores da Receita – categorias que se reuniram com o relator.
O Sindicato Nacional dos Procuradores da Fazenda Nacional (Sinprofaz) argumenta que a inscrição em dívida ativa é uma atribuição exclusiva da PGFN e que a Receita “não tem competência constitucional para realizar acordos de transação sem a participação, chancela ou autorização de um advogado público”.
Havia a expectativa de os deputados votarem também nesta sexta o projeto do novo arcabouço fiscal.
No entanto, em entrevista à GloboNews, o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), disse que a análise da proposta, que também é prioritária para o governo, ficará para agosto, após o recesso parlamentar.
A nova regra, se aprovada, substituirá o atual teto de gastos – que limita o crescimento das despesas à inflação do ano anterior.
O projeto já foi aprovado uma vez pela Câmara. Mas, como foi alterado no Senado, precisa passar por nova análise dos deputados. A medida, se aprovada, vai liberar o governo federal a realizar mais despesas.