Quase quatro anos depois de ser mencionado pela primeira vez como suposto ou possível mandante do assassinato da vereadora carioca Marielle Franco (Psol) e do motorista Anderson Gomes, o nome do ex-deputado Domingos Brazão reapareceu esta semana no noticiário sobre o crime de 14 de março de 2018. Isso ocorreu após a delação premiada do ex-PM Élcio de Queiroz.
Ontem (26), o site The Intercept Brasilpublicou extensa reportagem sobre o caso. Nela, relata que, em 11 de março de 2019, às 23h, três dias antes de o crime completar um ano, Jomar Duarte Bittencourt Júnior, conhecido como Jomarzinho, filho de um delegado da Polícia Federal, enviou mensagem por WhatsApp ao policial militar Maurício da Conceição dos Santos Júnior.
Jomarzinho dizia que, no dia seguinte, uma operação ligada à investigação do atentado contra Marielle prenderia várias pessoas. “Pelo que me falaram vão até prender Brazão e Rivaldo Barbosa”, afirmou Jomarzinho na mensagem. “Putz”, respondeu o sargento.
Isso já mostrava, primeiro, que a informação havia vazado. A menção se refere a Domingos Brazão, líder de um clã e família de políticos que atua na Zona Oeste do Rio de Janeiro, onde seria aliado de milicianos. Conselheiro do Tribunal de Contas do Rio, estava afastado do cargo pela Operação Lava Jato acusado de receber propinas de empresários do setor de transporte. Em março último, o Tribunal de Justiça do RJ autorizou, por 2 votos a 1, o retorno de Brazão ao TCE.
Em 27 de outubro de 2019 reportagem do porta UOL afirmou que o miliciano Jorge Alberto Moreth dissera em conversa telefônica com o vereador Marcello Sicilliano (PHS) que Brazão era o mandante e teria pago R$ 500 mil pelo atentado. A operação aconteceu como previu Jomarzinho segundo Intercept, mas os presos foram os ex-PMs Ronnie Lessa e Élcio de Queiroz, que fez a delação e voltou às manchetes esta semana.
Vingança contra Freixo?
A suspeita é de que Brazão “mandou matar Marielle para se vingar de Marcelo Freixo, ex-deputado estadual e atual presidente da Embratur na gestão Lula”, diz a reportagem do Intercept. Brazão foi citado na CPI das Milícias, em 2008, presidida por Freixo na Assembleia Legislativa fluminense. Marielle Franco trabalhou no caso como assessora parlamentar dentro no gabinete dele.
Sete anos depois, já em 2015, Brazão foi escolhido por aliados de seu partido na Assembleia, o MDB, para ocupar uma vaga do Tribunal de Contas do Estado. O padrinho da indicação foi o então presidente da Casa, Jorge Picciani (MDB). Freixo tentou sem sucesso impedir na Justiça a posse de Brazão no TCE.
Em 2017, o hoje presidente da Embratur se destacou ao auxiliar com informações a Operação Cadeia Velha, deflagrada em novembro de 2017, que prendeu os deputados estaduais Jorge Picciani, Paulo Mello e Edson Albertassi, que também foi indicado para o TCE. Mas dessa vez Freixo conseguiu uma liminar na Justiça e impediu a posse de Albertassi.
PGR: Brazão “arquitetou o homicídio”
Já em 2019, a então procuradora-geral da República Raquel Dodge afirmou, na denúncia contra Brazão por obstrução de justiça, que ele “arquitetou o homicídio” de Marielle. Como já fizera antes, Brazão negou qualquer envolvimento.
Em relatório da ministra Laurita Vaz, do Superior Tribunal de Justiça (STJ), a Corte julgou a federalização do caso em maio de 2020. No relatório da ministra, pode-se ler: “Cogita-se a possibilidade de Brazão ter agido por vingança, considerando a intervenção do então deputado Marcelo Freixo nas ações movidas pelo Ministério Público Federal, que culminaram com seu afastamento do cargo de Conselheiro do Tribunal de Contas do Estado do Rio de Janeiro”. Em 27 de maio de 2020, por decisão unânime, a Terceira Seção do STJ julgou improcedente o pedido de federalização do caso Marielle feito pela PGR.
Leia a íntegra da reportagem de Flávio VM Costa, André Uzêda, Carol Castro e Paulo Motoryn, em The Intercept Brasil.