No início de 2022, Valéria Amaral, 39, teve um quadro leve de diarreia causado por uma infecção intestinal. Sentia desconforto, cólica, mas nada que afetasse sua rotina.
Uma semana depois, acordou com os braços dormentes, imaginando que tinha dormido em cima deles. Quando levantou para trocar de roupa, lavar o rosto e escovar os dentes, não sentia força nos dedos.
“Fui fazer café e não conseguia acender o fogão nem digitar no celular. Ainda andava, mas achei estranho e fui ao hospital”, lembra a jornalista que mora em Brasília (DF).
Valéria passou por alguns exames iniciais enquanto o médico investigava se poderia ser um AVC (acidente vascular cerebral), por exemplo. Outra hipótese levantada, naquele momento, era a síndrome de Guillain-Barré, uma doença autoimune rara que afeta os nervos do sistema nervoso periférico, prejudicando os movimentos do corpo.
A jornalista ficou 2h30 no exame de ressonância magnética, que descartou problemas na coluna —outra suspeita do médico. Mas assim que foi se mover da maca, não andava mais. “Nem consegui passar de uma maca para outra”, diz.
Foi aí que desconfiaram ainda mais da síndrome. O diagnóstico foi concluído com ajuda de um exame de punção na lombar para análise do líquor (líquido cefalorraquidiano).
“Depois disso, foi só ladeira abaixo. Em horas, minha vida mudou”, conta. Na sequência, Valéria foi levada para a UTI. Mas nem imaginava o que era a síndrome —não conseguia mexer no celular para pesquisar algo— e pensava que iria para casa em breve, que tudo era um grande exagero.
No final do mesmo dia, não mexia quase nada. Não sentava mais sozinha. Colocaram fralda e um acesso venoso para medicação. A enfermeira dava comida na minha boca. Valéria Amaral
Entenda a síndrome de Guillain-Barré
É considerada uma doença autoimune, ou seja, o sistema imunológico começa a atacar uma parte do corpo.
O processo ocorre assim: ao produzir anticorpos para lutar contra algum invasor (seja uma bactéria ou vírus), o corpo tem uma resposta exagerada e, neste caso, acaba atacando também células dos nervos periféricos, responsáveis pelo movimento e sensibilidade dos músculos.
No caso da síndrome, o ataque pode ser na bainha de mielina (“capa de gordura” do neurônio) ou no axônio (parte do neurônio que envia mensagens ao corpo —caso de Valéria, mais grave).
Esse “ataque” do sistema imunológico deixa lesões na região que podem ser transitórias ou não. Isso resulta em alguns sintomas, como:
- Fraqueza progressiva que pode ocorrer da seguinte maneira: membros inferiores, braços, tronco, cabeça e pescoço;
- Fraqueza muscular ou paralisia total dos quatro membros;
- Sensação de dormência e queimação nos pés e pernas que, depois, pode ir subindo até braços e mãos;
- Alguns pacientes podem sentir dores no corpo (pernas, lombar).
Essa lesão leva a uma destruição da função do nervo periférico, impossibilitando que ele passe os sinais elétricos que estão vindo do cérebro e devem chegar até o músculo. Frederico Lacerda, neurologista
De acordo com os médicos, a síndrome tem como característica uma piora aguda e progressiva e, depois, uma melhora do quadro. A recuperação depende de cada paciente. Dados mostram que aproximadamente 50% se recuperam totalmente até seis meses depois de a síndrome se manifestar.
Fatores como infecções respiratórias e gastrointestinais podem desencadear a síndrome, além do zika vírus, dengue, sarampo, citomegalovírus, medicações e vacinas.
UOL