Foto: Divulgação.
O médico palestino com nacionalidade brasileira Ahmed Shehada, 58 anos, ficou preso no Aeroporto Internacional de Tocumen, no Panamá, por 32 horas, entre a última quinta-feira (16) e o sábado (18). Irmão de um ex-líder do Hamas (grupo militante islâmico de resistência palestina) que foi assassinado em 2002, ele diz que foi vítima de perseguição política.
A CNN entrevistou Shehada, que contou que foi liberado e deportado para o Brasil sem que o motivo da detenção fosse explicado. O médico, que também é presidente do Instituto Brasil-Palestina (Ibraspal), falou que passou por momentos de forte pressão psicológica e que foi interrogado em diversas salas por ao menos 20 pessoas diferentes, além de ser impedido de falar com advogados e de usar o aparelho celular.
“Eu fiquei preso sem nenhum motivo. Sou vítima de perseguição por causa da minha origem palestina”, relatou Shehada.
O médico, que tem cidadania brasileira desde 2015, contou que fazia conexão no Panamá em um voo que tinha como destino final a Colômbia, onde participaria de um encontro da comunidade palestina. Ele alega ter sido o único, de um grupo de cinco pessoas, a ser parado.
Levado para uma sala onde foi interrogado, Shehada teria sido repetidas vezes fotografado por pessoas que falavam línguas diferentes. Em determinado momento, ele suspeitou de que seria entregue para o Mossad –Instituto de Inteligência e Operações Especiais vinculado ao governo israelense.
“Pelo jeito, a intenção é que foram me entregar para Mossad, em Israel. Aqueles estrangeiros que estavam falando inglês eram agentes da Mossad, mas eu não posso confirmar 100%”, diz.
Se definindo como uma pessoa que atua também na área de direitos humanos, Shehada conta que sofreu diversos tipos de violação físicas e psicológicas. Entre os abusos, ele disse que ficou sem comer pelo período da detenção e que antes de embarcar ao Brasil, pessoas que sabiam da origem muçulmana (cuja religião veta o consumo de carne suína), foram oferecidas duas salsichas e duas fatias de pão de forma como lanche.
Ele também relatou que é paciente oncológico e que precisa de acompanhamento médico, mas mesmo assim foi ignorado. “Avisei que sou paciente oncológico e que não posso ficar naquelas condições. Mostrei para eles o laudo de tratamento paliativo, mas eles não se importaram. A embaixada também falou que não poderiam tratar daquele jeito, explica.”
O que diz a defesa do médico
O médico é acompanhado desde os primeiros momentos da detenção pela advogada de direitos humanos brasileira Talitha Camargo da Fonseca e pelo advogado de direitos humanos panamenho Gilberto Solís, que acionaram as autoridades junto com os membros do Instituto Brasil-Palestina, do qual Shehada é presidente.
Foi enviado ao departamento de imigração do Panamá um pedido de explicações sobre a retenção de Shehada por mais de 30 horas e sobre os interrogatórios seguidos que passou em sede da polícia de Estado.
A advogada explica que o Estado do Panamá é signatário da Convenção Americana Sobre Direitos Humanos e que, ao fazer parte da convenção, o país se compromete a respeitar liberdades individuais.
“Deve ser respeitado o direito à integridade física, psíquica e moral. Não sendo permitido tratamento que gere aflição, constrangimento. Não podendo as pessoas serem privadas de liberdade de voltar para o seu país de domicílio, no caso em tela, o Brasil”, finaliza.
Morte do irmão
Salah Shehadeh foi assassinado em julho de 2002 após um bombardeio aéreo israelense sobre Gaza. No ataque, 15 pessoas morreram, entre elas sete crianças. Outras 150 pessoas ficaram feridas, segundo reportagem da CNN.
Ele, que seria um dos fundadores de um dos braços armados do Hamas, era irmão do médico palestino-brasileiro preso no Panamá. Á época da morte, foi apontado por israelenses como um ativista do grupo islâmico envolvido em ataques contra civis e militares israelenses.
O bombardeio a Gaza foi tema de uma investigação do tribunal espanhol sobre crimes de guerra, abrangido pelo projeto Crimes de Guerra, com sede em Washington. De acordo com o relatório que baseou a investigação, o bombardeio israelense de Gaza em 2002 foi uma “punição desproporcional” que resultou na perda de vidas civis.
Atuação do governo brasileiro
A CNN consultou o Itamaraty sobre as providências que serão tomadas pelo governo brasileiro, mas até a publicação da reportagem não havia recebido respostas.
O deputado federal Glauber Braga (PSOL-RJ) já havia se posicionado nas redes sociais no dia 17. “Toda solidariedade ao presidente do Instituto Brasil-Palestina (Ibraspal), Ahmed Shehada. Ele foi retido ontem pela imigração do Panamá, teve o passaporte brasileiro recolhido, foi deportado e aguarda voo pra Brasília. NÃO à tentativa de criminalização da origem palestina.”
Créditos: CNN.