Pedidos de regalias em unidades prisionais do Rio Grande do Norte e retaliações a operações contra lideranças de facções criminosas podem estar entre as razões que motivaram uma série de ataques que aterrorizaram o Estado nesta terça-feira (14). É o que apurou a TRIBUNA DO NORTE com fontes do Ministério Público e forças de segurança ligadas à Inteligência do Estado. Segundo investigações, os “decretos” para ataques a ônibus, bancos e cidades potiguares partiram de dentro do Complexo de Alcaçuz. Uma das principais lideranças do Sindicato do Crime foi transferida para presídio federal nesta terça-feira (14).
“O que foi dito na reunião [entre forças de segurança pública] e ainda está sendo levantado é que os presos estariam reclamando dos tratamentos dentro dos presídios, porque foi cortado visita íntima, por exemplo”, confirmou a secretária de Segurança Pública e Defesa Social de Natal, Sheilla Freitas.
Segundo investigações do MPRN, a inteligência do RN identificou os possíveis ataques desde a última segunda-feira (13), fato que também foi confirmado pela Secretaria de Estado da Segurança Pública. Os ataques seriam uma resposta do Sindicato do Crime, facção do RN fundada em 2013, para cobranças de benefícios nos presídios, como acesso à visita íntima, ventiladores e TVs nas celas, além de reclamações ligadas à falta de acesso à celulares.
“A motivação para nós é clara: uma forma de pressionar o Estado, incluindo União e órgãos ligados ao sistema penal, para que voltem regalias que não estão previstas como direito, por isso são regalias, que existiam antes de 2017, inclusive visita íntima, entrada de produtos fornecidos por familiares, TVs e ventiladores nas celas”, apontam fontes do MPRN ligadas às investigações.
Aliado a isso, apurações das forças de segurança também creditam os ataques à operações recentes e prisões de lideranças de faccionados. “Acreditamos que com ações policiais anteriores, há 15 dias, onde houve um enfrentamento da segurança pública em relação a infratores, onde foi apreendida grande quantidade de drogas e armas, isso inquietou a delinquência a enfrentar o sistema de segurança pública”, disse o coronel Francisco Araújo, secretário de Segurança Pública do RN.
Entre essas operações recentes estariam a prisão de um homem e uma mulher na Vila de Ponta Negra, em Natal, com apreensão de drogas e dinheiro fracionado, na semana passada. Antes, no dia 22 de fevereiro, uma dupla incendiou dois ônibus nas Rocas, zona Leste de Natal, ação que pode estar relacionada a uma retaliação a morte de um membro da facção local, que segundo a Polícia Militar, teria atirado numa viatura e morto em confronto.
Aliado a isso, a inteligência do Estado identificou que os ataques foram ordenados por lideranças do Sindicato do Crime, entre eles, José Kemps Pereira de Araújo, também conhecido como “Ablon”, “Alicate” ou “Véio do Rio”. Considerado fundador da facção, Kemps foi preso em Pernambuco no dia 13 de janeiro deste ano, numa ação da Polícia Federal para cumprimento a um mandado judicial de prisão expedido pela 1ª Vara Regional de Execução Penal do Tribunal de Justiça do RN.
Coronel Araújo aponta que a Sesed soube antecipadamente da possibilidade de ataques. As medidas tomadas, no entanto, não foram suficientes, “Nós começamos a implementar ações, depois da notícia pelos levantamentos de inteligência, e foi o que se desencadeou com ações preventivas à tarde, noite e madrugada, com as forças enfrentando a criminalidade”, disse Coronel Araújo. Segundo o secretário de Segurança, coronel Francisco Araújo, a própria governadora Fátima Bezerra foi avisada ainda na madrugada da última terça.
Ataques
Esta não foi a primeira vez que facções criminosas promovem ataques a ônibus, carros, prédios, comércio e instituições públicas no Rio Grande do Norte. Nesta terça-feira (14), os ataques foram registrados em pelo menos 22 cidades do Estado.
Magnus Nascimento
Facção ordenou onda de crimes para pressionar o Estado a retomar visitas íntimas e instalar TVs nas celas, entre outras regalias
O último balanço de ações divulgado pela Polícia Militar apontou 21 suspeitos presos (sendo 1 adolescente, 2 Foragidos da Justiça recapturados e 1 tornozelado preso com arma de fogo); 5 armas de fogo apreendidas; 1 simulacro de arma de fogo apreendido; 18 artefatos explosivos apreendidos; 6 Galões de Gasolina apreendidos; 5 motos apreendidas; 1 Carro apreendido; além de dinheiro, drogas e munições.
Os ataques orquestrados já eram esperados pelos policiais penais do estado. É o que afirma a presidente do sindicato que representa a categoria, Vilma Batista. De acordo com ela, o aumento de concessões aos detentos e dificuldade na fiscalização contribui para situações como essa.Além disso, a representante dos policiais penais também explica que está havendo facilidade para a comunicação entre os detentos e membros da facção criminosa fora dos presídios.
Seap suspende visitas por tempo indeterminado
A Secretaria de Estado da Administração Penitenciária (Seap) anunciou nesta terça-feira (14) a suspensão da visita de familiares e atendimento para advogados em todas as unidades prisionais do Rio Grande do Norte em virtude dos ataques nas ruas do RN.
“Já adotamos algumas medidas em face à situação, suspendendo visitas de familiares e advogados. Explicamos isso a OAB, que compreendeu. Isso será o tempo que for necessário até que a situação se restabeleça”, disse o secretário Helton Edi Xavier.
O secretário de Administração Penitenciária, Helton Edi Xavier, disse que a pasta reforçou medidas de segurança nas unidades. O titular da pasta apontou ainda que a segurança foi reforçada dentro das unidades prisionais do Estado. Também foi solicitada presença federal da Força Nacional para auxiliar nas operações.
“Adotamos algumas medidas de segurança e protocolos para o bom funcionamento das unidades e isso incomoda. Essas ameaças sempre ocorrem e hoje, infelizmente, se consolidaram, mas é uma demanda justamente por conta dessas medidas adotadas que não agradam alguns internos”, disse o secretário de Administração Penitenciária do RN, Helton Edi Xavier. “Em relação a reivindicações, o apenado tem que entender que dentro do sistema ele precisa cumprir protocolos. O que é oferecido é o que a lei permite. Não há excessos nem faltas”, disse o secretário.
Tribuna do Norte