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Em uma festa de rua na Barra Funda, zona oeste de São Paulo, o ator Eduardo Godoy, de 29 anos, abordou um vendedor ambulante para comprar uma cerveja, dois sábados atrás. Ele aproximou o cartão de crédito da maquininha, mas a compra não passou.
Depois de mais duas tentativas frustradas por aproximação, Eduardo entregou o cartão para o rapaz inserir e pagar digitando a senha. O vendedor devolveu o cartão e o ator continuou curtindo a festa com sua cerveja. A diversão, no entanto, não durou muito.
“Quando fui passar o cartão outra vez, em outro lugar, o cartão foi recusado na aproximação e no modo de inserir. Paguei com outro cartão e não me dei conta do que estava acontecendo na hora, já era noite e eu estava bebendo desde o início da tarde. Só no outro dia que percebi que o cartão que estava na minha carteira não era meu e estava no nome de outra pessoa”, relata Godoy.
Eduardo foi vítima de um golpe que vem se tornando comum em festas de rua e blocos de Carnaval: vendedores ambulantes não credenciados se aproveitam da distração e, muitas vezes, da embriaguez dos clientes para roubar o cartão de crédito.
O golpista alega que a aproximação não está funcionando e pede para a vítima digitar a senha. O vendedor ou algum comparsa grava a sequência, entrega outro cartão para o cliente e fica com o dele.
Com o cartão e senha em mãos, os criminosos aproveitam para efetuar compras de alto valor, antes de a vítima perceber que caiu em um golpe.
Golpe da aproximação
O “truque” da troca do cartão é o mais comum nesses ambientes. Mas não é o único. O delegado Vitor Luna, da Divisão de Crimes Cibernéticos da Polícia Civil de São Paulo, afirma que esses grupos têm conseguido efetuar compras apenas aproximando a máquina dos bolsos das pessoas.
“Normalmente, quando elas guardam o cartão no bolso traseiro. Ele vai lá com a maquininha ‘muquiada’, sem a pessoa perceber, e encosta no cartão dela. E acaba fazendo esses débitos”, afirma o delegado.
O investigador explica que os bancos geralmente limitam o valor em compras por aproximação, mas o titular do cartão pode solicitar o aumento do limite.
Como os golpistas atuam
O Metrópoles colheu relatos de cinco pessoas que foram vítimas do golpe do cartão de vendedores ambulantes.
O modus operandi segue um mesmo roteiro: os golpistas geralmente atuam em dupla ou trio, vendem a bebida mais barato que os ambulantes credenciados e, na hora da compra, inventam alguma desculpa para fingir um problema na maquininha e forçar que a pessoa digite a senha.
Outro traço comum é que os criminosos entregam a cerveja já aberta para a pessoa, como forma de evitar que ela desista e vá comprar com outro ambulante. A abordagem geralmente é acompanhada de uma conversa descontraída, com o intuito de distrair a vítima e trocar o cartão sem que ela perceba.
“Os golpistas agem na ‘engenharia social’: vai entrando na mente da pessoa, ludibriando ela para que não preste atenção na hora da troca de cartão ou até mesmo para passar um valor maior”, afirma o delegado Vitor Luna.
Alguns simulam confiança na pessoa e falam para ela continuar pegando cervejas mesmo sem pagar na hora, sob o argumento de que a vítima em potencial pode pagar tudo antes de ir embora.
Como normalmente os “foliões” não ficam parados em um mesmo lugar, insistem em pagar e acabam entregando o cartão para o ambulante tentar passar em outra maquininha, geralmente de um comparsa. É nesse intervalo que o cartão é trocado.
Foi o que ocorreu com o publicitário Henry Gherson, de 31 anos, diante de uma balada no centro de São Paulo, no final de dezembro.
Ele conta que, nesses ambientes, utiliza somente a aproximação, justamente para não entregar o cartão na mão do vendedor. “Eu sempre me preocupei muito com golpe. Falava para as pessoas: ‘como você deixa alguém trocar seu cartão’?”.
“O cara falou: ‘fica tranquilo, deve ser minha máquina, pega aí sua cerveja, vai curtir. Eu te acho depois e cobro’. Ele falou que ia pegar uma maquininha com amigo dele. Deu uns 10 minutos, ele já veio com outra máquina. Nessa hora, provavelmente, eu dei meu cartão na mão dele. Porque deu erro de novo na aproximação e ele falou para inserir. Nessa de trocar maquininha, na verdade, ele foi buscar um cartão igual ao meu”, afirma.
O publiciário afirma que só percebeu o golpe no dia seguinte, quando abriu o aplicativo e viu que havia R$ 12 mil em compras na sua fatura.
Outras modalidades
Além dos “golpes da aproximação”, há outras estratégias utilizadas por criminosos para tirar dinheiro dos clientes.
Uma delas é bastante simples: se aproveitando do estado “alterado” de muitos foliões, os vendedores passam valores maiores. Em vez de passar R$ 30, passam R$ 300, por exemplo. Alguns chegam a usar maquininhas com o visor quebrado, para dificultar a visualização.
Há também modelos mais elaborados, mas que, segundo a Polícia Civil, são mais raros entre vendedores ambulantes.
“Tem loja, por exemplo, que coloca uma câmera em cima do vendedor. O equipamento consegue pegar o número do cartão, o código de segurança e senha digitada. O vendedor pede o CPF e endereço da pessoa para fazer um cadastro. A pessoa acaba passando todos os dados necessários para alguém fazer uma compra com o cartão dela”, explica Vitor Luna.
Há ainda maquininhas com softwares instalados capazes de capturar os dados do chip e clonar o cartão. “Essas maquininhas são bem mais caras e por isso não são comuns entre vededores ambulantes”, afirma o delegado.
Nesta semana, um novo golpe foi divulgado pela empresa de cibersegurança Kaspersky. Um grupo de hackers brasileiros especializados em golpes financeiros desenvolveu um programa malicioso que bloqueia pagamentos por aproximação em pontos de venda. Sem a aproximação, consumidores são obrigados a inserirem o cartão físico na máquina, permitindo a fraude.
Como se prevenir
Confira abaixo algumas dicas para não ser vítima de golpes neste Carnaval:
- Guardar o cartão sempre no bolso da frente; os golpistas costumam aproximar a maquininha nos bolsos de trás
- Nunca perder o cartão de vista, isso evita a troca
- Sempre conferir o nome no cartão quando recebe de volta
- Olhar o valor no visor da maquinha antes de passar a compra
- Pedir a segunda via e confirir o valor
- Se possível, consultar o saldo bancário em algum momento do bloco. Com isso, dá tempo de acionar o banco e cancelar a compra, caso tenha sido vítima de um golpe
- Comprar sempre de vendedores credenciados
- Se possível, deixar o cartão em casa e ir para o bloco apenas com dinheiro vivo
Créditos: Metrópoles.