Foto: Fabio Vieira/Metrópoles.
Antes de se tornar um cão policial, o pastor-belga-malinois Tank já demonstrava ser um filhote equilibrado e seguro, características estimadas pelo Canil da Polícia Militar de São Paulo (PM).
Quando ele ainda mamava, foi escolhido pelo cabo Santos Silva, do 5º Batalhão de Choque da PM, que comprou o filhotinho já com o intuito de trabalharem juntos no Canil da corporação, localizado na zona norte da capital paulista.
“Selecionamos o Tank porque ele se mostrou equilibrado e seguro, além de ser muito bom de boca [come bem], o que facilita no treinamento, principalmente de obediência”, explicou Silva ao Metrópoles.
Em 2 de julho de 2018, quando completou 45 dias de vida, Tank foi retirado da ninhada e levado à casa do cabo Silva, onde começou sua formação como cão policial.
Na nova morada temporária, antes de ser levado definitivamente para o canil, o pequeno Tank trabalhou no desenvolvimento de suas habilidades de socialização, ambientação, habituação a estímulos sonoros, estimulação olfativa — para farejar e achar o brinquedo — , preceitos básicos de proteção e de detecção.
“Ele foi um cão que treinou todos os dias de vida, sem passar um único dia sem treinar, até sua formação completa”, acrescentou Santos Silva.
Ao completar dez meses de vida, Tank foi levado ao canil da PM, onde concluiu sua formação como cão policial, aprendendo a identificar o cheiro de drogas.
Em entrevista ao Metrópoles, o tenente Sidnei Sampaio, comandante do Gabinete de Treinamento e do Departamento de Cães do 5º Batalhão, frisou que cachorros treinados para localizar entorpecentes não ficam viciados.
“Isso é uma grande falácia. Usando essa lógica, então, o cão que encontra explosivos é viciado em explosivos e o que encontra pessoa é viciado em pessoas? O cão é viciado em uma coisa: na brincadeira. É compulsivo pela bola dele e pelo condutor [parceiro]. Ele para o que estiver fazendo, para obter isso.”
O oficial se referiu ao treinamento dos cachorros, que relacionam o encontro de drogas, explosivos e pessoas a uma brincadeira, na qual são recompensados com uma bola.
O estagiário
O treinamento dos cães policiais, iniciado desde os primeiros dias de vida, demanda paciência e dedicação diárias. Um cachorro está apto para ir às ruas, como estagiário, entre seu primeiro ano e meio e segundo ano de treinamento.
Em 2019, quando começou a se embrenhar em ações reais, Tank ajudou a localizar 73,132 quilos de drogas. Para isso, segundo o cabo Silva, ele também contou com a ajuda de outros cães policiais, mais experientes, acompanhados de perto pelo então estagiário.
Ainda em 2019, Tank participou da 4ª edição do evento K9 Olympics, realizado em Guarulhos, na Grande São Paulo. Participaram do evento cães de países como Rússia, Estados Unidos, Nigéria, Paraguai, Chile e Canadá.
Durante cinco dias, os competidores foram submetidos a diversas provas de habilidades como detecção de drogas, explosivos, busca e captura, busca e resgate, obediência, prova de condicionamento físico com cão, guarda e proteção, além de ataque.
Mesmo sendo ainda um principiante, Tank conquistou o terceiro lugar na categoria faro em veículo e ficou em oitavo na classificação geral, que contou com 50 cachorros. Isso foi uma prévia do que estava por vir.
Recordista da PM paulista
Em 2020, Tank bateu o recorde de localização de drogas, feita por cães farejadores, da PM paulista. Ao todo, ele ajudou na apreensão de 1.007 quilos de entorpecentes, o equivalente a 50% do total tirado das ruas pelo 5º Batalhão de Choque.
Isso fez com que a foto do recém-chegado já fosse colocada no mural de K-9 do ano. A sigla K-9 deriva do inglês. Quando pronunciada a sílaba e o numeral, a sonoridade se assemelha à palavra canino, no idioma estrangeiro.
“Conforme o Tank foi desempenhando bem o trabalho na rua e adquirindo experiência, ele passou a trabalhar sozinho”, afirmou o cabo Santos Silva.
Dois anos depois, Tank bateu o próprio recorde e ajudou a PM a apreender 1.361 quilos de drogas, garantindo um segundo quadro com sua foto, no mural K-9 do ano, em reconhecimento ao seu trabalho, correspondendo a 30% de todas as apreensões do ano.
Desde que ingressou na corporação, em 2019, até hoje, Tank já ajudou a tirar das ruas 2.718 quilos de drogas.
Mantendo a tradição
Tank é o maior o destaque do batalhão na atualidade. Mas o Canil para o qual ele presta serviços só existe graças à atuação do pastor alemão Dick, doado ainda filhote, em 1953.
Naquela década, o Canil da PM vivia um momento de tensão, pois o então governador Jânio Quadros, às voltas com cortes de despesas públicas, ameaçava encerrar as atividades da polícia com cachorros.
Ele teria enviado um bilhete ao comando da PM com a seguinte frase: “Faça os cães trabalharem ou dissolva a matilha.”
Na ocasião, o rapto do menino Eduardinho, em 17 de abril de 1956, chocou a sociedade paulista.
Após farejar o travesseiro da criança, Dick encontrou o garoto, vivo, três dias após o desaparecimento. A criança estava em uma região de mata, perto de onde atualmente se localiza o Zoológico de São Paulo.
Durante as buscas, Jânio Quadros enviou um bilhete à Secretaria da Segurança Pública, indicando que gostaria de promover quem eventualmente encontrasse o garoto.
O governador cumpriu a promessa, promovendo tanto o soldado e tutor Muniz como o pastor alemão. Dick é o único cão da polícia com a patente de cabo.
O feito dele garantiu a continuidade do Canil da PM. Como reconhecimento, foi feito um busto do cabo Dick em bronze, que fica até hoje na entrada do batalhão da zona norte.
Segundo os registros, Dick morreu em junho de 1959, vitimado por congestão hepática passiva. Seu parceiro humano faleceu aos 88 anos, após sofrer um acidente vascular cerebral, em 2016.
Créditos: Metrópoles.