Foto: Presidência da Argentina.
A secretária de Energia da Argentina, Flavia Royón, anunciou na segunda-feira (12/12) que seu país conta com US$ 689 milhões de financiamento do BNDES para concluir a construção do 2º trecho do gasoduto Néstor Kirchner, de quase 500 km e que vai até San Jerónimo, na província de Santa Fé.
O Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social, ainda sob comando do governo de Jair Bolsonaro (PL), emitiu uma nota dizendo que não há essa liberação.
Ocorre que interessa ao futuro governo, do presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que toma posse em 1º de janeiro de 2023, reaproximar o Brasil do país vizinho. O petista já recebeu o presidente argentino, Alberto Fernández, logo depois da vitória e prometeu visitá-lo tão logo tome posse, no 1º trimestre de 2023.
Ao câmbio desta 6ª feira (16.dez.2022), os US$ 689 milhões pretendidos pela Argentina equivalem a R$ 3,6 bilhões.
“Iniciamos a construção do primeiro trecho do gasoduto Presidente Néstor Kirchner, que aumentará a produção de Vaca Muerta e ampliará a capacidade de transporte de gás em 30% e nos permitirá economizar 2 bilhões de dólares em importações. Além disso, obtivemos financiamento de 689 milhões de dólares do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social e outros 540 milhões do CAF [Banco de Desenvolvimento da América Latina] para seu segundo trecho”, disse Flavia Royón, segundo reportagem no site de notícias Vacamuertanews.
O BNDES soltou uma nota na 4ª feira (14.dez.2022) dizendo que houve uma consulta, mas ainda não tem um pedido formalizado para oferecer o financiamento: “O governo argentino, por meio de sua embaixada em Brasília, e empresas brasileiras entraram em contato com o BNDES e com o Ministério da Economia em consulta sobre eventual financiamento à exportação de bens brasileiros. Não há pedido formal de financiamento protocolado no BNDES”.
A reserva de Vaca Muerta, no oeste da Argentina, é uma formação geológica rica em gás e óleo de xisto. O xisto é um tipo de rocha metamórfica que tem um aspecto folheado e pode abrigar gás e óleo em frestas. Para extrair gás desse tipo de local há um processo considerado muito danoso ao meio ambiente, porque é necessário quebrar o solo, num sistema conhecido em inglês como “fracking”, derivado “hydraulic fracturing”.
Nesse tipo de processo, é necessário fazer uma perfuração vertical no solo até uma determinada profundidade. Depois, a broca muda para a direção horizontal para ir fraturando o solo, inserindo água e produtos químicos e assim liberando gás e óleo que possa estar “preso” entre as rochas.
O gás de xisto é muito explorado nos Estados Unidos e foi fonte de energia barata nas últimas décadas para turbinar o crescimento econômico norte-americano. Mas há muitas preocupações com o efeito que isso causa ao meio ambiente. A Escola de Saúde Pública de Yale, uma universidade dos EUA, publicou um texto em março de 2022 dizendo que o “fracking” usado “extensivamente aumentou as preocupações sobre o impacto no meio ambiente e na saúde das pessoas”.
“O processo requer grande volume de água, emite gases que provocam o efeito estufa, como o metano, libera ar tóxico na atmosfera e produz barulho. Estudos indicam que esse tipo de operação para extrair óleo e gás podem levar a perda dos habitats de plantas e animais, declínio das espécies, disrupções migratórias e degradação da terra. Estudos também demonstraram haver uma associação entre os locais de extração de óleo e gás de xisto com gravidezes malsucedidas, incidência de câncer, hospitalizações e episódios de asma”, diz o texto da Yale University.
O financiamento de um gasoduto que pretende transportar gás de xisto é hoje contraditório para a agenda verde do BNDES, que tem sido uma das prioridades do banco de fomento brasileiro.
A Argentina já tem neste momento cerca do dobro de gasodutos em relação à malha instalada no Brasil. O Brasil tem amplas reservas de gás natural no pré-sal. O insumo não é explorado aqui justamente por causa da falta de dutos para transportar o gás.
O Brasil reinjeta cerca de metade do gás do pré-sal. Por ser extraído de forma direta dos poços em alto mar, esse tipo de processo é muito menos danoso ao meio ambiente do que o usado para extrair gás de xisto.
Créditos: Poder 360.