‘É difícil conceber seção com dezenas de eleitores e se ter voto apenas para determinado candidato’, disse o ex-ministro.
Foto: Fellipe Sampaio | SCO | STF
O presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Alexandre de Moraes, determinou que a Polícia Federal (PF) ouça, em 48 horas, o ex-secretário da Receita Federal e economista Marcos Cintra sobre o questionamento feito a respeito da apuração das eleições de 2022.
Em entrevista à CNN Brasil nesta segunda-feira (7), o ex-ministro Marco Aurélio Mello, do Supremo Tribunal Federal (STF), que já presidiu o TSE por duas vezes, saiu em defesa de Cintra, afirmando que o professor somente exerceu um direito inerente à cidadania de se expressar.
“É preciso ler a fala do Marcos Cintra, ele apenas exteriorizou uma preocupação e disse que se empunha a tomada de providências pela Justiça Eleitoral para verificar o fato. Fato que teria sido levantado no próprio Tribunal Superior Eleitoral. Que fatos são esses? Algumas seções não apresentarem um único voto para o candidato à reeleição”, declarou Mello.
Na avaliação do ex-ministro, Marcos Cintra não tentou desmerecer o processo eleitoral brasileiro muito menos atacar o Estado de Direito, ao contrário do que escreveu Alexandre de Moraes no despacho judicial que determinou a tomada de depoimento na PF.
“Evidentemente, ele exerceu um direito inerente à cidadania de expressar-se, de revelar uma preocupação. Ele não tentou desmerecer em si o sistema de urnas eletrônicas. A Constituição Federal garante a liberdade de expressão, a liberdade de manifestação e proíbe qualquer censura”, frisou.
Na visão de Marco Aurélio, ao contrário de medidas draconianas contra a liberdade de expressão, o TSE poderia ter aberto um processo administrativo para investigar se os apontamentos de Marcos Cintra têm ou não fundamento. Segundo ele, isso aumentaria a credibilidade da Justiça Eleitoral.
“Agora, que se abrisse, no âmbito do Tribunal Superior Eleitoral, um processo administrativo para se levantar de forma mais concreta os dados apontados por ele. Aí, sim, uma nota do Tribunal dizendo da insubsistência ou da subsistência parcial desses dados, ou dizendo da ausência de repercussão no campo técnico, que é possível ter-se em determinada seção votos dados a um único candidato”, disse.
Em sua fala, o ex-magistrado chamou Moraes à razão, ainda que de forma sutil, questionando se o presidente da Corte tinha lido a publicação do professor Cintra. Ele atribuiu a reação do ministro a uma postura autoritária e classificou como censura a derrubada do perfil do ex-secretário da Receita.
“O que nós estamos vendo na verdade é uma censura. Eu imagino que o Alexandre de Moraes tenha lido o que falou o cidadão Marcos Cintra e, a meu ver, os atos determinados contra ele extravasam o campo da normalidade e do bom senso. Queremos que se retroaja a uma época já sepultada? Queremos viver momentos de exceção?”, finalizou.
Mello também disse que os questionamentos de Marcos Cintra são válidos. Ele afirmou também enxergar com estranheza algumas situações na eleição presidencial que desfavoreceram o presidente Jair Bolsonaro (PL) e favoreceram Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
“É difícil conceber seção com dezenas de eleitores e se ter voto apenas para determinado candidato. […] E me preocupa mais a questão de agrupamentos indígenas e quilombolas. Caso se confirme o que ele veiculou, têm-se aí verdadeiros currais eleitorais e evidentemente não há campo para isso”, finalizou.