Nos cerca de três anos que o mundo vive a pandemia da Covid-19 as questões relacionadas à saúde mental vieram à tona de forma que até então não era falada. De acordo com o Relatório Mundial da Saúde Mental divulgado pela OMS (Organização Mundial de Saúde), em junho deste ano, uma em cada oito pessoas vive com problema mental.
O número de pessoas doentes cresceu, e a preocupação com o assunto também aumentou. “Identificou-se com a pandemia a importância do cuidado emocional, tanto buscando ajuda de um profissional especificamente, como a pessoa poder cuidar-se mais, levar-se mais sério. A pandemia forçou um movimento que muitas vezes nós deixamos de fazer”, disse a psicóloga Claudia do Valle Pinheiro.
Isso pode ser mostrado também por um levantamento feito por uma rede particular de atendimento médico popular que atende em São Paulo, Grande São Paulo, Santos e Rio de Janeiro. Entre janeiro e agosto de 2022, foram realizadas cerca de 12.000 consultas de psicologia e psiquiatria por mês, o que resulta em mais de 550 atendimentos por dia.
Esse número representa um aumento de quase 20% dos atendimentos realizados em relação ao período de janeiro a agosto de 2021, e um salto de 35% se comparado a 2020.
Dia Mundial de Prevenção ao Suicídio
No Dia Mundial de Prevenção ao Suicídio, que é celebrado neste sábado (10), a preocupação com essas questões ficam mais expostas. Ainda mais se analisado o investimento público destinado a tratar esse problema, que chegou a diminuir durante a pandemia. O mesmo documento da OMS relatou que apenas 2% dos orçamentos de saúde e menos de 1% de toda a ajuda internacional são dedicados à área.
“Na saúde pública, questiona-se muito os processos psicoterápicos, porque não é em uma consulta que o paciente vai receber a orientação e pronto, acabou. É um processo que precisa dar continuidade, cada um tem seu próprio ritmo. Infelizmente na nossa realidade da saúde pública, nós não estamos muito preparados para isso. Precisa de investimento”, alerta a psicóloga.
Os números do DataSUS apontam que de 2010 até 2020 – últimos dados disponibilizados pelo Ministério da Saúde – o número de suicídios no Brasil cresceu mais de 40%, foi de 9.448, em 2010, para 13.835, em 2020. Se a comparação for com o ano 2000, o salto mais que dobra. Isso sem contar as subnotificações.
A melhor forma de prevenir o suicídio é a percepção das questões mentais, livres de preconceitos e estigmas, e o tratamento especializado da doença.
O psiquiatra integrante do corpo clínico do Dr.Consulta e especialista da ABP (Associação Brasileira de Psiquiatria), Bonifácio Rodrigues, orienta que notar os problemas de saúde mental envolve três questões fundamentais.
“A saúde mental está muito envolvida ao sofrimento mental. A boa saúde mental seria um bem-estar físico. Eu tenho que perceber que as coisas não vão bem e quando eu tenho um sofrimento psíquico. Nesse caso, temos de olhar três eixos: a duração, a intensidade e o quanto esse sofrimento sai do meu habitual de vida inteira”, destaca o médico.
Adultos entre 20 e 29 anos são maioria entre os suicidas
Um dado comum em todas as estatísticas é que os adultos entre 20 e 29 anos são a maioria entre as pessoas que tiraram a própria vida. Em 2020, foram 2.767 pessoas que se suicidaram nessa faixa etária, e em 2019 , 2.840.
O médico explica que isso acontece porque a maioria dos problemas de saúde mental acontece antes dos 21 anos de idade.
“A maioria dos transtornos mentais acontece antes dos 21 anos, quase 50%, antes dos 15 anos. Essa questão de o jovem ter saúde mental intacta é lenda. Porque os transtornos mentais começam desde muito cedo e vão evoluindo com o tempo”, alerta Rodrigues.
A busca por ajuda só acontece quando os problemas já estão persistentes, complementa o médico. “As pessoas procuram ajuda quando estão com muito prejuízo na vida interpessoal, ou seja, são anos de doença não tratadas justamente porque tem essa questão de que um jovem tem a vida toda pela frente. Os jovens têm o futuro todo pela frente, uma energia, mas isso é real quando falamos do jovem saudável.”
Preocupação com idosos
Na comparação dos anos de 2019 – pré-pandemia – e 2020 dos números de suicídios, os números das faixas etárias que mais cresceram, proporcionalmente, foram dos idosos.
“Os idosos que sofreram muito com falta de convívio social, por serem considerados risco para o desfecho morte. Tudo isso os assustou bastante, o isolamento aumenta a chance de depressão no idoso, de ansiedade, de demência”, afirma o psiquiatra.
Rodrigues alerta ainda que a preocupação com a saúde mental das pessoas com mais de 60 anos é ainda mais esquecida pela saúde pública.
“Nossa pirâmide etária tem se invertido e efetivamente não há preocupação com a saúde dessa população, principalmente na saúde mental dos idosos. Nós vemos CAPS [Centro de Atenção Psicossocial] especializados em infância e adolescentes, adultos, álcool e drogas e não tem centro de atenção psicossocial, que é uma política pública de saúde pública, especializada no idoso, e o idoso tem suas particularidades”, lamenta o especialista.
Para conseguir atentimento psicológico e psiquiátrico no SUS (Sistema Único de Saúde) é necessário procurar uma unidade de saúde mais próxima da residência e pedir atendimento. Será feita uma triagem e cada caso será encaminhado a um tipo de profissional por meio dos CAPS.
Outra opção de ajuda gratuita é o CVV (Centro de Valorização da Vida) que oferece apoio emocional e de prevenção ao suicídio, sob sigilo, por telefone, email, chat e voip 24 horas todos os dias. A ligação para o CVV em parceria com o SUS, por meio do número 188, é gratuita a partir de qualquer linha telefônica fixa ou celular.
Créditos: R7.